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Foto do escritorPaulo Vinicius

Resenha: "Middlewest vol. 2" de Skottie Young e Jorge Corona

Depois da explosão de Abel, ele acaba precisando deixar a trupe itinerante e se dirige a outra cidade sozinho. Se sentindo abandonado, o menino precisa encarar a possibilidade de que pode estar se tornando igual a seu pai.



Sinopse:


A jornada de Abel para lidar com o legado de sua família continua a partir do desaparecimento de um novo senso se estabilidade. O escritor Skottie Young (de I Hate Fairyland e Deadpool) e o artista Jorge Corona (de Nº 1 with a Bullet e Feathers) levam Abel para alguns lugares familiares e inevitáveis, outros desafiadores e novos. A jornada por Middlewest mostrou a estes viajantes que o seu lar pode estar mais escondido do que eles jamais poderiam ter imaginado.






Somos o reflexo de nossos pais? Herdamos todas as características, boas e ruins? Existe essa noção de inevitabilidade? Essa é uma pergunta que nos fazemos em algum momento de nossas vidas. Seja em relação a sentimentos positivos ou negativos. Sermos diferentes é encontrar nossos próprios caminhos na vida. Mas, quando lidamos com personalidades complicadas como abusadores, trambiqueiros ou pessoas violentas no geral, esse questionamento é ainda mais agudo. É o que se passa na cabeça de Abel durante todo esse volume. E isso acaba fazendo aflorar nele um lado obscuro, que não é algo que ele herdou, mas que se manifestou nele por conta das circunstâncias. Esse volume é uma enorme viagem pelos sentimentos do personagem enquanto ele procura encontrar o seu lugar no mundo. Quando as portas se fecham para ele, Abel se vê desamparado e sem alguém que possa lhe dizer o que fazer, ou apenas lhe aconselhar e lhe mostrar alguma luz no fim do túnel. Ou apenas alguém que esteja ali para ele.


Confesso: não gostei dessa edição. O protagonista me irrita profundamente. O roteiro é repleto de camadas, mas não consegui superar a minha irritação com o protagonista. Em vários momentos em que algumas pessoas lhe oferecem uma mão, ele fica marcado por ser um moleque grosseiro e chato. Ao mesmo tempo, Abel é inconstante e intempestivo. Sim, faz parte do roteiro, mas essa instabilidade é bizarra. Tem momentos em que ele muda completamente de uma página para outra. Consigo compreender a dor pela qual ele está passando, a da solidão e abandono ao mesmo tempo em que sente dúvidas acerca de si. Mas, mesmo aqueles que são bondosos com ele como a pequena raposa e a jovem garota são afastados por ele sem mais nem menos. Isso me faz questionar se Abel está realmente se desenvolvendo ou se ele apenas repete ações sem parar. Porque não consigo ver algo sendo assimilado por ele; muito pelo contrário, ele regrediu. Novamente: essa irritação com o protagonista fez com que eu não desfrutasse do roteiro da HQ e me incomodasse ao mesmo tempo.


A ação se passa em dois momentos distintos: a saída de Abel da trupe itinerante e o momento em que ele é capturado por sequestradores. Os dois momentos refletem o abandono sofrido por ele por todos ao seu redor. E aí entra uma dúvida: no lugar da dona da trupe, que buscou ajudar Abel, você continuaria mantendo-o junto dos seus ou expulsaria o garoto em prol de momentos de tranquilidade e segurança? Como um bom professor, teria feito o mesmo questionamento que a menina fez a ela. Uma classe de alunos não é formada apenas por alunos exemplares. Sempre vai ter aqueles mais difíceis. A experiência que eu tenho no magistério é que se o professor for dedicado e conseguir conquistar aqueles alunos mais difíceis, estes geralmente são os que mais valorizam o papel do mestre. Posso dizer que alguns dos meus alunos que chegaram mais longe são aqueles que mais me deram problemas. O nosso papel como pessoas mais experientes é passar nossos conhecimentos aos mais novos. Claro que a forma como eles vão absorver esses conhecimentos vai ser diferente de como imaginamos. A trajetória nem sempre vai ser mais simples e muitas vezes teremos que sacrificar um ambiente mais sossegado por um turbulento e desafiador. Faz parte do cotidiano. Quando abandonamos alguém à própria sorte, deixamos de dar uma oportunidade para que uma pessoa mais complexa possa nos mostrar sua profundidade.



O pai de Abel segue em seu caminho de destruição em busca do filho. Esse volume também é dedicado a trabalhar a relação familiar de Abel com seu pai e sua mãe. Aparentemente ele teria sido abandonado pela mãe, que saiu de casa e foi viver sua vida. E o deixou com seu pai e seu espírito violento. Tentar compreender as motivações de seu pai para ir atrás dele é algo que exige mais raciocínio de nossa parte. O que eu consigo depreender disso é uma postura controladora de sua parte. O desafio de Abel à sua autoridade foi compreendido como algo inaceitável, algo que ele precisa remediar. E essa necessidade se transfere também para um controle da narrativa em que ele é inocente do que é acusado. Outro comportamento de um pai abusivo. A justificativa para o que faz ou é uma "boa educação" para seu filho ou para que ele aprenda a "respeitar os mais velhos" ou até o de "devolver o investimento que ele teve". Até o presente momento, o pai do Abel é aquele tipo de personagem que está além da redenção. Não vejo como o Skottie Young vai colocar o personagem em outro caminho além de desaparecer da vida do protagonista.


Somos apresentados à origem dos poderes dos personagens: do pai do Abel, do próprio protagonista e de seu avô que representa a linhagem mais antiga até o momento. Pelo que deu a entender os poderes deles tem duas fontes essenciais: suas emoções e o clima. O avô de Abel aparece sempre seguido de uma nevasca que pode significar uma pessoa mais tranquila, porém tempestuosa quando irritada; o pai é o tornado que tudo destrói por conta de sua violência inerente e Abel mistura o medo e a fúria. Só que o moleque chato sai da presença de seu avô sem ouvir explicação alguma. E a gente continua sem saber muito a respeito dos poderes. Fato é que o avô alega que eles são uma espécie de benção mais do que uma maldição. Infelizmente dominá-los exige um pouco de maturidade daquele que está manuseando. Ou a capacidade de se manter no controle de suas próprias ações, algo que nem Abel e nem seu pai conseguem. Existe uma rusga familiar forte entre o pai e o avô que tem a ver com a morte de sua avó.


A segunda metade da HQ nos revela um imenso local de cultivo para drogas alucinógenas. Um local para onde Abel e sua amiga lá da trupe itinerante são enviados. Ainda não sabemos muitas informações a respeito, mas parece que essa substância pode ser tóxica para aqueles que fazem sua colheita. Abel e outras crianças são levadas para lá onde realizam um trabalho compulsório. Sua amiga também é capturada e levada para o lugar onde eles presenciam as regras de convivência. Como a série termina no volume 3 já estou achando que esse é um plot que não vai ser bem desenvolvido e vai servir mais como um lugar onde Abel vai explodir, destruir tudo e seguir em frente. Esse volume 2 caiu bastante em qualidade em relação ao primeiro volume. Existem várias questões emocionais e familiares sendo trabalhadas pelo autor, mas a falta de carisma dos personagens me afastou da narrativa e me fez ficar rabugento com a leitura. A arte do Corona é linda, mas a minha rabugice fez eu olhar para o outro lado.


O Quadrinho em 1 Quadro:



Para falar da arte do Corona, não escolhi nenhuma imagem específica. Queria mostrar como ele aborda suas páginas, seu design de personagens e a preocupação com os detalhes. Confesso não ser tão fã do design deles, acho-os estilizados demais. Mas, uma coisa é inegável: seus personagens são bastante expressivos. Se eu for pensar por essa linha e imaginar que o quadrinho trata de emoções exacerbadas, então o artista faz muito bem o seu trabalho. Sabemos quando Abel está nervoso ou triste, ou o aspecto briguento do pai ou a expressão compassiva da raposa que acompanha Abel. Esse trabalho com closes na face é uma constante em todos os capítulos. É uma necessidade para o artista, para definir como o personagem se sente naquele momento e como os acontecimentos ao seu redor influenciam o seu humor. Seus poderes são afetados por como ele se sente: às vezes é uma pequena ventania que bate no fundo, às vezes é alguma simbologia que vai lembrar um tornado. Nesse número Corona teve também que individualizar os personagens que possuem poderes. O avô de Abel não manifesta os seus poderes da mesma forma.


As grades são bem retas, ilustrando um emprego tradicional delas. Em alguns momentos, Corona deixa sua imaginação fluir construindo superquadros que ocupam meia página ou página inteira. As splash pages não são frequentes, mas quando aparecem, ilustram cenas lindas. Parando para pensar, Corona é o artista perfeito para essa HQ. As cores são vibrantes, a preocupação com o fundo pode ser vista até no quadro acima que representa apenas um cômodo onde Abel e sua mãe estão naquele momento. Percebam a proporção dos móveis, a existência de diferentes objetos e em como o cenário não possui brancos. Ele é todo preenchido. Vamos nos lembrar que Middlewest é um quadrinho voltado para o público infanto-juvenil, então cores berrantes são importantes para chamar a atenção dos leitores para o que está acontecendo. Só que eu achei que nessa edição Corona não conseguiu brincar tanto com as cenas nos quadros. A arte ficou mais contida. Somente nos dois últimos capítulos que deu para curtir algumas cenas bem bacanas como uma visão do alto de um campo que vai ser trabalhado pelas crianças. No mais, achei que o roteiro não ajudou tanto o artista.












Ficha Técnica:


Nome: Middlewest vol. 2

Autor: Skottie Young

Artista: Jorge Corona

Editora: Image Comics

Número de Páginas: 160

Ano de Publicação: 2019


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