Resenha: "A Princesa de Brinquedo" de Mary de Morgan
- Paulo Vinicius
- 20 de mar.
- 3 min de leitura
A princesa Úrsula vive em um reino onde expressar emoções e sentimentos não é algo bem visto pela sociedade. As pessoas precisam ser polidas e educadas e alguém sensível como ela acaba se tornando triste e infeliz. Só que uma fada decide trocar a princesa por um versão de brinquedo da princesa. O que irá acontecer?

Sinopse:
A princesa Úrsula nasceu e cresceu em um reino apático. Qualquer demonstração de afeto, emoções ou questionamentos são moralmente condenáveis. Quando uma fada madrinha a sequestra e coloca uma substituta em seu lugar, Úrsula finalmente tem a chance de descobrir uma vida para além dos limites de seu reino.
Considerado um conto de fadas feminista e pioneiro, A princesa de brinquedo é uma história sobre independência e liberdade, escrito por Mary de Morgan em 1877, e chega com exclusividade na Sociedade das Relíquias Literárias.
Esse é um daqueles contos que te surpreendem. Fui sem a menor expectativa embora tenha gostado do outro conto que li da Mary de Morgan (que foi O Colar da Princesa Fiorimonde) e a narrativa consegue trazer temas muito atuais. Falamos muito hoje sobre opinião pública e alguns de nós vão se identificar com esse sentimento. Onde parece que somos os únicos sãos em uma sociedade insana. Onde, por mais que tentemos explicar coisas lógicas para os outros, as pessoas parecem não se tocar disso. Ontem aconteceram eleições no meu município e o candidato que teve a campanha indeferida, acusações de corrupção durante o mandato e compra de votos durante o pleito foi o que venceu. E mais: as pessoas se orgulham de terem conseguido vender seus votos e pagar pelo churrasco. Me sinto como a fada Tambureta tentando explicar a razoabilidade de desfazer a troca, pois Úrsula é uma menina fantástica. E receber apenas complacência e críticas em troca. O mais curioso de tudo é que li A Princesa de Brinquedo e fiquei com essas ideias da narrativa martelando na mente e o quanto ela me fez refletir sobre isso. Como Tambureta, cheguei à conclusão de que vale mais investir na minha felicidade e deixar as pessoas lidarem com seus próprios dilemas. Não é o pensamento mais saudável do mundo (ainda mais em um planeta literalmente pegando fogo), mas sofro menos com isso.
A escrita é bem simples e direta, e Mary de Morgan investe em diálogos que são bem delineados para o leitor entender o que está acontecendo. Posso até reclamar de algumas falas meio redundantes, mas no geral essa parte é bem conduzida e conseguimos identificar quem está falando e para quem, algo fundamental para a coerência textual. O estilo de escrita é o narrativo, sem muitos floreios. Em certos momentos vamos pensar estar diante de um conto de fadas como Cinderela ou Rapunzel, então Mary explora bastante esse setor limítrofe entre a fantasia pura e simples e o conto de fadas (há diferenças? sim... podemos conversar sobre isso em outra ocasião). O lado mágico é normalizado pelos personagens; o rei convida a fada para tomar um chá e conversar sobre sua filha. A estrutura do texto segue a narrativa em três atos, com o começo mostrando o sofrimento de Úrsula, para o desenvolvimento ser sua vida com a família camponesa e o clímax/conclusão levando ao seu retorno. Bem estruturado e do tamanho correto para não parecer ter elementos a mais.
Gosto de como Mary nos mostra seus personagens. Eles quase sempre não seguem os padrões sociais da época. Se você está procurando por personagens estereotípicos do século XIX, não é aqui que vai encontrar. Fiorimonde era uma princesa extremamente desonesta e arrogante; Úrsula apesar de ser uma garota virtuosa, não tem a menor aptidão ou vontade de ser uma princesa. Se outras das famosas princesas optariam por se autossacrificar para manter a estabilidade do reino, Úrsula quer apenas a sua felicidade e Tambureta entende que isso é o melhor para ela. Ou seja, não temos uma mulher submissa e que aguenta o sofrimento calada, mas encontra a felicidade com seu príncipe encantado. Por essa razão podemos considerar Mary de Morgan como uma autora de vanguarda nos primórdios de um pensamento mais feminista. Adorei o conto e é mais uma das grandes surpresas do ano para mim.

Ficha Técnica:
Nome: A princesa de brinquedo
Autora: Mary de Morgan
Compõe a coleção da Sociedade das Relíquias Literárias
Editora: Wish
Tradutora: Camila Fernandes Número de Páginas: 71
Ano de Publicação: 2024
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