A vida de Bruno como desenhista de uma grande empresa de quadrinhos sempre foi muito difícil. Lidando com as dificuldades do relacionamento à distância, ele toca sua vida. Até que um dia ele encontra o síndico do seu condomínio enforcado. Daí as coisas começam a tomar um rumo diferente.
Sinopse:
Essa história lida um pouco com as burrices sociais de alguém que passou a vida toda desenhando, lendo quadrinhos e tentando transformar isso em profissão.
Os altos e baixos da vida de um quadrinista
Conheci este quadrinho de uma forma bem curiosa: estava assistindo aos diversos vídeos de Youtube indicando obras legais para serem adquiridas na CCXP 2019 e este acabou me chamando a atenção. Anotei, guardei na lista, mas nunca foi uma daquelas coisas que eu estava babando para comprar. Chegando no evento, comecei a minha peregrinação pelas mesas de artistas, olhava algumas coisas, comprava, deixava outras para lá. Até que eu parei na mesa do Bruno. Comecei a folhear a HQ e quando me peguei estava batendo altos papos com o artista. Ele é uma pessoa muito simpática, tenho um humor afiadíssimo (como você pode conferir na HQ), além de ser alguém que entende as dificuldades na vida de um quadrinista, principalmente do ponto de vista pessoal. Essa HQ não é melodramática ou água com açúcar; mesmo sendo bem leve, ela é realista na medida em que te coloca em situações que você não acredita que um homem adulto pode passar, mas que são verdade. Principalmente por um quadrinista, cuja vida precisando cobrir prazos acaba obscurecida e sem contato social.
Bruno é um quadrinista que trabalha para uma grande empresa e vive em um condomínio onde passa a maior parte do tempo. Foi criado por duas mães que são muito atenciosas e, aparentemente, bastante corujas com ele. Seu trabalho acabou afastando-o de sua amada Débora. Ela luta para conseguir um emprego aonde Bruno está morando. Mas, até o momento as oportunidades não vem. A rotina muda quando um certo dia, Bruno sai para comprar algumas coisas para comer e, quando retorna, encontra a porta aberta e se depara com uma cena chocante: o síndico do condomínio havia cometido suicídio. A partir de então a vida de Bruno dá uma estranha virada com coisas se sucedendo rapidamente.
A arte do Bruno é agradável, embora a HQ nem exija algo tão rebuscado. Mesmo assim, me agrada a dedicação em preencher o cenário, em dar vida aos personagens em usar bem o letreramento. No geral, temos de três a cinco quadros por página, mas ele brinca de vez em quando com a ordem ou com a noção de splash pages. O design de personagens também está ótimo, sendo que estes são bem distintos uns dos outros. Gosto do emprego de uma palheta de cores clara, o que facilita a leitura. Alguns podem reclamar do papel ser tipo papel jornal, mas sinceramente? Não me incomodou nem um pouco e não prejudicou a arte. Gostei da escolha do Bruno porque dá até um ar nostálgico para mim que viveu toda a febre dos anos 80 e 90.
Acredito que a narrativa seja uma autobiografia do Bruno. Ou pelo menos boa parte dela é. Não tive coragem de perguntar isso para ele, preferindo perguntar como começou a ideia de escrevê-la e pelo que dá para perceber a HQ é uma catarse. Um lugar onde o Bruno pode extravasar seus problemas e suas angústias. O que ele narra nas páginas de What Now, Bruno? são situações comuns do cotidiano: lidar com jantares desencontrados, comprar presentes para bebês, ajudar a esposa a encontrar um trabalho. O corriqueiro que ganha ares bem divertidos na pena do autor. Não é aquele quadrinho que você vai rachar o bico de tanto rir, mas certamente você vai se pegar dando aquele sorriso espontâneo. Isso porque o humor presente na trama gira entre a ironia e a boa espiritualidade.
O personagem passa por várias situações engraçadas, mas uma das que me chamou a atenção é de o quanto não enxergamos o artista ou o roteirista de quadrinhos como verdadeiramente uma profissão. Em vários momentos da história isso acontece: quando os policiais vem interrogá-lo como testemunha do suicídio, depois quando ele vai ao jantar com o casal esquisito. Outra situação oriunda da profissão de quadrinista vem com o assédio dos nerds. Super pertinente a crítica feita por ele. Mostra um pouco da realidade vivida por eles, que são confundidos com alguns poucos considerados superstars. Claro que ele exagera um pouco (será?) para dar um ar bem humorado e engraçado, mas é aterrador até para fazermos uma auto-análise sobre como encaramos estas pessoas.
Bruno também aproveita para introduzir alguns temas de forma secundária na narrativa. E eu gostei como ele joga essas coisas como se fosse algo bastante natural. Um dos temas é a questão das aparências, quando duas meninas conversam sobre uma delas não se sentir bonita, sendo que ela é linda. Essa ditadura da beleza acaba fazendo com que a pessoa enxergue alguém mais feio do que ela realmente é. A amiga tenta fazê-la entender que isso é uma bobagem e que ela deveria se sentir bem por ela mesma. Vemos muitas meninas passando por isso diariamente. Criando dietas absurdas ou passando por sacrifícios extremos para ganhar uma beleza que já estava ali antes. Esse é um sintoma dos nossos dias atuais que vive das aparências.
Esta é uma daquelas HQs leves que são boas de se ler entre leituras. Arte agradável, história divertida, momentos para refletir. Tem todos os ingredientes para algo memorável. E, só para deixar claro: este é o volume 1. O final da história deixa alguns ganchos para serem trabalhados depois. Já quero mais histórias do nosso protagonista.
Ficha Técnica:
Nome: What Now, Bruno?
Autor: Bruno Oliveira
Editora: Auto-publicado
Gênero: Biografia/Humor/Cotidiano
Número de Páginas: 72
Ano de Publicação: 2019
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