Zuok está cansado de ser um duende explorado. Não aguenta mais ver seus iguais sendo escravizados e perdendo sua própria identidade. Em uma narrativa divertida e absolutamente bizarra, Cláudia Dugim nos coloca diante de um protagonista LGBT e um cenário repleto de doces enquanto fala de escravidão e a luta por direitos.
Sinopse:
Zuok é um duende escravizado de quem tiraram os poderes mágicos, cansado da servidão e de morar embaixo do fogão de Lili Peruqueira, ele planeja uma revolta. Com ajuda da amiga For, uma formiga, e de alguns companheiros duendes, ele pretende mandar de volta os conquistadores que escravizaram seu povo e destruir a cidade feita de doces e açúcar que os invasores construíram.
Sempre gostei de truques de mágicos. Desses que a gente vê na televisão. Aqueles caras espalhafatosos que tiram coelhos da cartola, fazem uma assistente flutuar, tiram moedas de trás de nossas orelhas. Truques de prestidigitação. A capacidade de distrair a nossa atenção com outras coisas para esconder o que realmente está sendo realizado. Cláudia Dugim brinca um pouco de ser mágica e brinca com a nossa percepção. Em uma história absurda, porém muito divertida, ela consegue trabalhar temas pesados como escravidão e revolução. Isso em um cenário de alta fantasia, com situações bizarras e um pouquinho de libertinagem.
Nosso protagonista é Zuok, um duende escravo que trabalha embaixo de um forno para sua mestra Lili Peruqueira. Uma vida dura e difícil da qual ele retira pouquíssimas recompensas. Mas, anos e mais anos de exploração começam a assomar nas costas dele até que Zuok decide tentar combater o que estava acontecendo. Vamos ver um pouco da vida oprimida dos duendes e como eles, apesar de toda uma existência marcada por um status de inferioridade buscarão a recuperar sua dignidade.
A Cláudia surpreende nesse conto com sua habilidade em colocar em neon o absurdo e enganar o leitor desatento. São tantas coisas legais nesse conto que eu nem sei por onde começar. Bem, vou falar um pouco dos personagens. A autora emprega personagens LGBTQ em sua narrativa com tamanha naturalidade que chega a encantar. Muitos autores acabam empregando personagens gays ou lésbicas como se fosse algo forçado ou até estereotipando demais os personagens. Se a autora não tivesse me falado que Zinzi era o amante de Zuok eu nem imaginaria que ele é gay. Ou seja, ele é um personagem normal com uma opção sexual distinta. Ele precisa sair bailando com plumas e paetês? Não (seria divertido, mas não é o caso). O mesmo pode ser dito de Lili, que é uma lésbica, mas tem toda um jeitinho fofo e feminino de ser. Gosta de doces e de se divertir. A autora não forçou a mão nos personagens e criou um protagonista profundo e complexo por trás de toda aquela aura de absurdo na narrativa.
A escravidão é apresentada em toda a sua crueldade nessa história. Os duendes são oprimidos por mestres que podem ser duros ou apenas abusivos com eles. Depois de muito tempo sendo escravos, os duendes não conseguem enxergar outra vida que não a de prisioneiro ou a de mero criado da casa. Quando Zuok tenta iniciar sua rebelião ele vai esbarrar nesse obstáculo. O conformismo com o status quo se tornou parte desses seres. Outro aspecto da escravidão é que não é necessário ser violento para ser abusivo. Lili gosta de Zuok, mas enxerga nele apenas um objeto a ser usado. Um dos aspectos mais cruéis da escravidão é a objetificação das pessoas. Elas deixam de ser encaradas como pessoas e passam a ser vistas como parte da casa, como uma cadeira, uma mesa ou um armário. Quando quebra, substitui-se por outro. Por essa razão é que eu entendo a escolha de Zuok no final.
Volte para seu Lar é um conto curtinho, mas repleto de mensagens que nem sempre estão claros ao leitor. É um exercício de atenção e interpretação que a autora propõe a seus leitores. Por essa razão eu só tenho elogios à brincadeira (apesar de uma brincadeira séria em vários momentos) que a Cláudia nos apresenta. E convido a todos que conheçam outros trabalhos dela.
Ficha Técnica:
Nome: Volte para seu Lar Autora: Cláudia Dugim Editora: Auto-Publicado Gênero: Fantasia Número de Páginas: 41 Ano de Publicação: 2018
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