Ged nasceu com um potencial incrível para a feitiçaria. Mas, ele logo vai aprender que tais poderes vem enormes responsabilidades. E ele vai aprender da pior forma possível.
Sinopse:
Há quem diga que o feiticeiro mais poderoso de todos os tempos é um homem chamado Gavião. Este livro narra as aventuras de Ged, o menino que um dia se tornará essa lenda.
Ainda pequeno, o pastor órfão de mãe descobriu seus poderes e foi para uma escola de magos. Porém, deslumbrado com tudo o que a magia podia lhe proporcionar, Ged foi logo dominado pelo orgulho e a impaciência e, sem querer, libertou um grande mal, um monstro assustador que o levou a uma cruzada mortal pelos mares solitários.
Publicado originalmente em 1968, O feiticeiro de Terramar se tornou um clássico da literatura de fantasia. Ged é um predecessor em magia e rebeldia de Harry Potter. E Ursula K. Le Guin é uma referência para escritores do gênero como Patrick Rothfuss, Joe Abercrombie e Neil Gaiman.
A série Terramar é um clássico de fantasia. Sem dúvida alguma. Foi porta de entrada para inúmeros leitores. Foi inspiração para autores do calibre de Neil Gaiman, J.K. Rowling e Patrick Rothfuss. Isso sem falar na habilidade de escrita monstruosa da Ursula K. Le Guin. Portanto, antes de tecer qualquer crítica ao livro é preciso pensar nisso. Em segundo lugar, é preciso refletir sobre quando o livro foi lançado: 1968. Uma outra época com outros parâmetros, além de Ursula ter sido pioneira no gênero. Ela criou o parâmetro. Mas, quando eu abri o livro para ler apenas pensei em quão maravilhoso seria poder ler um livro da autora novamente. Amo de paixão a escrita dela. Acabei tendo sentimentos mistos em relação a este livro.
A escrita da Ursula é algo único. Ele ressoa como uma bela partitura de piano. É uma escrita sonora que possui uma série de elementos musicais como cadência, ritmo e precisão. Estamos diante de uma verdadeira contadora de histórias, cuja narrativa parece ser falada pela própria autora ao redor de uma fogueira. Qualquer leitor mais experiente vai perceber na hora a intencionalidade da colocação de frases e o quanto sua escrita nos coloca dentro do universo. Entretanto, ao mesmo tempo eu senti o peso da escrita dela. Tive muita dificuldade em determinados trechos, pois os parágrafos mais alongados criavam um cansaço maior em mim. O livro é pequeno, mas parece ter o dobro do tamanho. Fica aqui o aviso: não leiam rápido. O ideal é ler parcimoniosamente, atentando para todas as referências e informações que a autora vai deixando a cada página. Todas são importantes para a história em si.
Aparentemente, O Feiticeiro de Terramar foi escrito para ser apreciado por um público infanto-juvenil. Acho um pouco complicado isso. Apesar de não ser uma história violenta nem nada neste sentido, acho a leitura pesada demais para uma criança ou um adolescente. Se formos colocar obras mais ou menos contemporâneas de Terramar como A Espada de Shannara ou O Último Unicórnio (um clássico de Peter S. Beagle) vamos nos colocar de uma leitura mais amigável a este público. É possível ler, mas creio que vai exigir mais do leitor. Talvez eu não esteja conseguindo abstrair e me colocar na pele de um adolescente da década de 1960 (fazendo essa transposição), mas sei lá. Não consigo visualizar algo nesse sentido.
"Todo poder é um só em sua fonte e seu fim, acho. Anos e distâncias, estrelas e velas, água, vento e feitiçaria, a arte nas mãos de um homem e a sabedoria na raiz de uma árvore: todos surgem juntos. Meu nome, o seu e o verdadeiro nome do sol, de uma fonte de água ou de uma criança que ainda não nasceu, tudo isso são sílabas da grande palavra que lentamente está sendo pronunciada pelo brilho das estrelas. Não existe outro poder nem outro nome."
O protagonista, Ged, não é aquele personagem que você vai sentir afinidade. Ele não é um personagem "gostável". Ursula dá uma humanidade incrível ao personagem tornando-o humano, passível de erros e acertos. Em muitos momentos, a gente vai xingar o personagem pelas escolhas que ele faz ao longo da história. Por outro lado, é preciso dizer o quanto o personagem é bem delineado. Se podemos dizer algo sobre a história é que se trata de uma jornada de amadurecimento. Em um primeiro momento, Ged é arrogante, sentindo ser alguém acima das pessoas comuns. Sua conduta explosiva em vários momentos acaba lhe custando sua posição. Quando ele liberta algo assustador, Ged precisa se responsabilizar por suas ações. Sua arrogância vai lhe custar sua tranquilidade. Ele precisará partir e não estabelecer um local fixo para viver devido a uma força sombria que o persegue.
O que eu não gostei em relação aos personagens é que não há um desenvolvimentos dos coadjuvantes. A história se centra quase que inteiramente no Ged. Eu gostaria que a Ursula tivesse trabalhado outros personagens como o Vetch, o Jaspe e o Ogion. Fora a quase total ausência de personagens femininas relevantes para a história. Temos a bruxa Sennet e, mais tarde, a irmãzinha de Vetch, Milefólio. Mas, nenhuma com um papel que realmente fosse importante. Temos trechos enormes com apenas o Ged nos guiando pela história o que pode ficar bem chato depois de algum tempo.
A ideia de criar a magia dos nomes é genial. Certamente Ursula se inspirou nas antigas religiões mesopotâmicas de forma a demonstrar como cada palavra possui enorme poder sobre o objeto que ela nomeia. Isso serve para objetos, animais ou pessoas. Muitas antigas culturas acreditavam que uma pessoa exercia enorme poder sobre outra caso soubesse seu "verdadeiro nome". Ursula trabalha esse tema até de forma filosófica como na passagem que vemos acima. E até na forma como ela estabelece as limitações dos poderes mágicos. Não é que alguém vai sair lançando bolas de fogo por toda parte. Se eu uso o calor, algum lugar ficará com frio; é uma questão de troca equivalente. O feiticeiro deve entender quando deve ou não usar seu poder. Quando lemos obras como O Nome do Vento é possível estabelecer várias relações nesse sentido, apesar de Rothfuss avançar um pouco mais nesse assunto.
"Havia um peso e um temor em seu coração quando ele subiu as docas de Serd. Os dias ficavam cada vez mais curtos com a proximidade do inverno e o crepúsculo chegou cedo. Com o anoitecer, a inquietação de Ged sempre aumentava, e agora dobrar uma esquina parecia-lhe uma ameaça, e ele tinha que se esforçar para não ficar olhando para trás, por cima do ombro, procurando algo."
Sobre a narrativa propriamente dita, não consegui me engajar completamente. Essa é uma perspectiva bem minha mesmo. Por isso, eu acho que cada leitor vai retirar sua própria interpretação daquilo que está lendo. A história não foi capaz de me cativar muito pelo fato de eu não conseguir torcer pelo personagem. Ged é um personagem complicado de nos simpatizar. Por essa razão muito do que ele passa é fruto de suas próprias escolhas ruins. Ele paga por aquilo que colheu ao longo de toda a história. No terço final da história admito que estava me arrastando para terminar (tinha até iniciado outro livro para me estimular a terminar logo o da Ursula) e desfrutei menos da jornada de Ged. Mas, como eu disse: é algo completamente subjetivo da minha parte. Esse é um daqueles livros que eu irei reler posteriormente.
O Feiticeiro de Terramar é um clássico do gênero de fantasia. Se você teve sua fase de Harry Potter, gosta de O Nome do Vento e adora boas narrativas, esse é o livro para você. É um daqueles livros chamados de essenciais para todo leitor. Ursula tem uma escrita única e que eu gostaria de ver mais autores adotando a forma dela de contar uma história.
Ficha Técnica:
Nome: O Feiticeiro de Terramar Autora: Ursula K. Le Guin Série: Ciclo de Terramar vol. 1 Editora: Arqueiro Gênero: Fantasia Tradutora: Ana Resende Número de Páginas: 175 Ano de Publicação: 2016
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