No agreste nordestino, muitas criaturas sobrenaturais assolam a vida deste povo sofrido. Toninho e Josefa são especialistas na arte de caçar tais criaturas. Toninho é um caçador cuja profissão é de família; Josefa é uma maga cujo sangue vem do Tinhoso.
Sinopse:
Toda lenda tem raízes na realidade e Toninho sabe disso melhor do que ninguém – a seca é apenas uma das muitas maldições que assolam o Agreste. Fantasmas, vampiros e gigantes não assustam esse jovem caçador de demônios, mas ele se surpreende ao conhecer a misteriosa Josefa, que também percorre as estradas áridas do Nordeste atrás de criaturas malignas. As intenções da maga em lutar contra os seres de outro mundo talvez sejam obscuras, mas a jornada ao seu lado certamente será uma aventura inesquecível...
Conheci a escrita da Paola através de uma coletânea chamada Piratas e lá a autora não tinha conseguido atacar bem o tema da pirataria. Mas, a gente percebia que havia muito potencial a ser explorado. Em O Auto da Maga Josefa a escrita dela está muito mais madura e objetiva. Sabe quando as linhas transbordam personalidade? É isso. Ela não só misturou nordeste brasileiro com fantasia, mas transformou o ambiente em algo seu. As expressões usadas pelos personagens, as descrições únicas, e todo aquele clima árido estão presentes aqui. Quando iniciamos a leitura de um capítulo, conseguimos ouvir o som do forró no fundo, sentir o calor do sol no lombo. Com uma narrativa em terceira pessoa, somos apresentados a dois personagens muito bem trabalhados ao longo da narrativa.
A narrativa é composta de forma episódica com cada capítulo compondo uma história meio fechada. Existe um arco maior no fundo que vai se revelando e só vai ser resolvido bem no final. Os capítulos são de bom tamanho e a cada um deles vamos nos envolvendo mais com os personagens. A gente tem até uma disputa de repentes mais para o final da trama. Lembro que eu lia os versos e tentava imaginar como seria repente. Sinal de que a estratégia da autora deu muito certo. Não apenas isso como ela brinca com algumas ferramentas narrativas: iniciar a história pelo final, colocar uma história de investigação, entre outros temas que ela brinca ao longo da narrativa.
“Eu sou pansexual e não me envergonho disso. – Vendo a confusão que certamente estava estampada na cara dele, complementou com mais suavidade: - Depois te entrego um panfleto do futuro sobre o assunto se quiser entender melhor. Toninho demorou alguns segundos para recuperar a fala. - Pan o quê? - Panfleto.”
Os personagens acabam se tornando parte da gente. Criamos laços afetivos com eles. De um lado temos Toninho, um caçador de demônios e outras criaturas sobrenaturais. Apesar de muito experiente, ele é um pouco atrapalhado e vemos isso ao longo das missões. Mesmo assim, ele possui um enorme coração e ele sempre acaba por surpreender Josefa, uma maga que não espera tanto das pessoas. Do outro temos Josefa, que possui um enorme segredo escondido que pode ou não afetar as missões que eles estão realizando. Sempre envolta em um ar misterioso, aos poucos ela vai se abrindo graças à personalidade de Toninho. Cada uma das missões serve para trabalhar algum elemento de personalidade dos mesmos. Ou seja, acompanhamos a evolução deles pouco a pouco até chegar ao clímax do livro.
“Esse negócio de pacto com Deus não existe, não, queridinha. Quem criou o conceito de pacto fui eu e a patente só cai daqui duzentos e trinta mil anos. Isso é pirataria.”
A relação de ambos é incrível. Eles possuem uma química excelente. É difícil falar em química entre personagens se não os estamos visualizando na telinha. Mas, é possível construir isso através de um bom roteiro. E a Paola faz isso através de várias cenas entre eles. Me lembro de rir horrores em algumas passagens. Se Toninho tem uma personalidade às vezes chamativa e atrapalhada, Josefa representa uma pessoa mais dura, moldada pela vida. A teimosia dela esbarra na personalidade aberta de Toninho. Isso proporciona momentos impagáveis como quando ela invoca um feitiço de silêncio em Toninho porque ele estava falando demais. E eles não conseguem interrogar uma testemunha direito. Ou quando eles precisam ir atrás de uma criatura (não vou estragar a surpresa de o que é) e a única pessoa que viu é um gago.
Temos uma jornada de redenção feita por Josefa. Apesar de que não dá para usar exatamente essa expressão. Essa jornada se inicia muito mais porque a personagem é assolada por sua própria origem. O fato de ela ser julgada como filha do capeta a coloca na mira daqueles que se aproximam dela. Ninguém sequer se importa em conhecê-la adequadamente. Por conta deste tipo de julgamento, ela cria uma espécie de redoma emocional que impede os outros de se ligarem a ela. Mas, vamos percebendo que Josefa é uma mulher doce e emotiva. Ela precisa manter essa casca para não se machucar, mas Toninho vai quebrando as resistências dela.
A autora alterna momentos extremamente divertidos com outros mais sérios. Ela consegue sair da comédia e ir para o drama em questão de segundos. Mas, no fundo, O Auto da Maga Josefa é um livro leve e divertido. Aquele tipo de história que você pega quando está com vontade de se distrair e ler algo que vai remeter à nossa própria cultura ao mesmo tempo em que vai nos entreter. Para mim, é uma das melhores leituras do ano e eu não parava de ficar com vontade de continuar a ler sem parar. Inclusive comecei esse livro depois de outro que eu estava lendo e acabei por terminá-lo antes. O poder de uma boa escrita. Ah, fica uma curiosidade: para quem já leu Lobo de Rua, da autora Janayna Bianchi, tem um easter egg escondido na história. Quero ver vocês acharem!
Ficha Técnica:
Nome: O Auto da Maga Josefa
Autora: Paola Siviero
Editora: Dame Blanche
Gênero: Fantasia
Número de Páginas: 250
Ano de Publicação: 2018
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