Um quadrinho que mostra a luta de Little Hope para salvar os rebeldes canadenses da opressão do Estado Teocrático Norte-Americano. Um futuro assustador. Uma HQ violenta. Uma luta pela liberdade.
Sinopse:
Com o mesmo escopo sem limites de Star Wars e as explorações sócio-política de O Conto da Aia, Little Bird nos conta a história de uma jovem em um movimento de resistência contra um opressor Império Amerciano enquanto busca por sua própria identidade em um mundo em chamas. Um épico lindamente ilustrado onde uma menina arrisca tudo para salvar o seu povo, suas terras e a liberdade que eles anseiam tão desesperadamente.
Uma luta desesperada
A narrativa se passa em um mundo onde os Estados Unidos se tornaram uma nação teocrático sob o domínio de uma espécie de autoridade papal. Todos aqueles que não obedecerem à nova ordem são taxados como inimigos e queimados ou crucificados. O poder religioso vem da capacidade que esta nova ordem tem de alterar geneticamente o corpo das pessoas. Mas, algum acidente acabou fazendo com que os habitantes de Nova Vaticano tivessem seus corpos deformados. A elite dirigente protegeu a si mesma do contato com o que causou o acidente e eles buscam uma solução. Tantoo é uma mulher que foi encontrada no Canadá e parece ter habilidades especiais que conferem a ela uma existência além da vida normal. O Cardeal a resgata enquanto ela fugia do Machado (um guerreiro que usa as cores da bandeira canadense) enquanto ele buscava matá-la. Mostrando-se ser uma pessoa de confiança, o Cardeal leva Tantoo até os laboratórios de Nova Vaticano. Lá ele começa a fazer experimentos terríveis até que ela morre, vítima dos horrores. Só que Tantoo revive. E de Tantoo, Little Bird é gerada. Mas, Tantoo faz o possível para que Little Bird consiga fugir e se esconder no Canadá onde um grupo de rebeldes luta contra a opressão. Vai caber a Little Bird liderar estes rebeldes em uma guerra sem esperanças contra o estado teocrático.
Sim, a história é pirada. Polgeest consegue criar um mundo rico em detalhes e narrativa, mas ao mesmo tempo ele vai fritar a sua mente até você conseguir entender tudo. Sei que vou ser criticado por isso, porque vou contra a corrente, mas achei o enredo de Little Bird convoluto demais. Tem muita coisa para você apreender em um curto espaço de tempo. Algumas edições eu precisei ler umas duas ou três vezes para conseguir pescar todos os elementos de narrativa. Por um lado, isso demonstra o quanto o autor fez um roteiro impecável onde símbolos aparecem por toda a parte nos cinco números dessa HQ. Tem uma cena fenomenal com crucificação lá no número 4 que é de arrepiar. Mas, ao mesmo tempo, isso prejudica o leitor que precisa brigar com a leitura para poder entender a riqueza de detalhes. Esse ponto para mim me deixa muito dividido entre o gostar e o não gostar. Por exemplo, eu adoro as narrativas do Jonathan Hickman, cerebrais e que exigem do leitor; mas, aqui o que eu senti é que eu estava recebendo uma metralhadora de informações sem que muitas respostas me fossem dadas. É legal o autor pedir ao leitor que forme suas próprias respostas, mas quando ele cria condições para isso. Tem um buraco enorme de narrativa entre o número 2 e o número 3 que eu fiquei confuso se um certo fato tinha ou não acontecido.
Little Bird é uma personagem em busca de seu lugar no mundo. No começo ela não compreende a sua importância para o movimento rebelde. Conhecer Tantoo vai servir para reforçar as crenças da personagem. Aliás, o autor brinca com o ciclo do eterno retorno. Todas as coisas ocorrem de forma cíclica na história: o surgimento de Little Bird, sua morte, sua ascensão e as consequências. O destino se adapta àquilo que lhe está sendo confiado. Sempre vemos um novo começo surgindo a partir das cinzas de algo que já se foi. É esse eterno retorno que Tantoo tenta explicar em uma cena completamente psicodélica no segundo número. As coisas acontecem por um motivo e cabe a nós usarmos de nossa capacidade de agir no mundo para buscarmos algo para aqueles que amamos. A inércia só serve como um obstáculo para a mudança.
Isso pode ser visto na narrativa do Machado. Um homem que teve um passado deplorável e que lhe dá pesadelos até hoje. Sua imortalidade só servia para fazê-lo ficar cabisbaixo e aceitar a opressão. Quando Little Bird busca sua ajuda, ele vê uma oportunidade de corrigir seus erros e tentar um caminho diferente. Sua luta deixa de ser a SUA para se tornar a luta pelos OUTROS. Existe um algo maior do que ele mesmo envolvido. Não chega a ser uma fé cega, apenas um compromisso consigo mesmo de buscar resolver os problemas de seu povo, usar suas habilidades por um bem maior.
Uma narrativa muito simbólica
A arte de Ian Bertram está linda nessa HQ. Bem detalhista e com muitas coisas acontecendo por toda a página. Ele se aproveita do fato de Polgeest inserir muitos detalhes em sua narrativa para complementá-los com imagens que entregam ainda mais. Preparem-se para ver muito simbolismo religioso como a vinda de um messias, uma crucificação, um bando de adoradores, a queima de bruxas. Polgeest realmente fez uma HQ criticando bastante o fundamentalismo religioso exacerbado que corrói nossa sociedade nos dias de hoje. O quanto fechamos os olhos para o que está acontecendo por conta de soluções fáceis. O mais curioso é que a população de Nova Vaticano aparece pouquíssimas vezes em toda a narrativa enquanto que os rebeldes canadenses povoam as páginas. Alguns diálogos entre a madre e o cardeal mostram a alienação do povo. Como a religião se tornou o seu ópio, a sua droga.
Bertram nos presenteia com cenários sujos e carregados em uma palheta escura. Em alguns momentos o artista me fez lembrar a arte de Frank Quitely nos X-men do Grant Morrison. Aquele foco nas expressões e nos cenários que fornecem muita riqueza para a narrativa apresentada. Algumas splash pages são lindas, mas eu quero destacar como Bertram sabe conduzir uma narrativa gráfica como na imagem acima. Esses três pequenos quadros conseguem contar uma história e fazem com que o leitor retire muito de muito pouco.
A HQ é bem violenta com vísceras sendo espalhadas por toda a parte. Quem não gosta de narrativas gore eu recomendo ficar longe. Principalmente no número 1 e no 3 as cenas são fortes. No número 5 é o contexto todo que faz a violência simbólica ficar pesada. Mesmo assim eu gostei como Bertram não tem pudores ao nos conduzir em cenas de ação incríveis. Tem uma perseguição em que membros do estado teocrático estão perseguindo Little Bird e um dissidente em que a gente consegue sentir o disparo da bala chegando próximo de nós. As cenas são bacanas sem serem confusas.
Aparentemente Polgeest vai continuar contando histórias neste mundo. A mim, Little Bird não foi espetacular, mas apresentou uma narrativa provocativa e interessante. Senti muitos furos no roteiro e perguntas que não foram respondidas. Espero que isso tenha sido proposital para que o roteirista possa abordar esses temas no próximo volume da série. A arte de Bertram está incrível. Ele faz um baile de sangue e vísceras por todas as páginas, além de entregar um mundo futurista cruel.
Ficha Técnica:
Nome: Little Bird - The Fight for Elder´s Hope
Autor: Darcy van Polgeest
Artistas: Ian Bertram e Matt Hollingsworth
Editora: Image Comics
Gênero: Ficção Científica
Número de Páginas: 208
Ano de Publicação: 2019
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