A chegada de Kérrera, uma alienígena cujo corpo diminui de tamanho a cada ferimento, faz a tripulação do Borunga ficar em polvorosa. Ribu, nossa protagonista, logo faz amizade com ela. Mas, Kerrera é questionadora e se pergunta por que a nave Borunga só resgata uma pessoa de cada planeta em fase de destruição.
Sinopse:
Ribu, uma garota humana, é salva da destruição da Terra pela tripulação alienígena do navio Borunga. Aos sete anos, descobre que o Borunga é uma embarcação que atravessa o multiverso buscando planetas e mundos prestes a morrer e salva deles um único espécime inteligente. Depois de cinco anos na embarcação, Ribu se torna uma de suas mais confiáveis marujas, titular nas missões de resgate. É quando é escalada para salvar Kérrera, uma menina-ovo, que logo se torna sua amiga — e também estopim de muitas mudanças no navio.
Santiago Santos criou uma ambientação incrível e variada em sua história. Imaginem uma nave espacial que contém um exemplar de cada indivíduo de planetas que estão prestes a ser destruídos. Na maior parte das vezes, a tripulação do Borunga resgata uma espécie do sexo feminino (isso quando há distinções de gênero). Nessa jornada pelo espaço profundo, essa tripulação tenta se manter unida em situações que exigem muito de cada um deles. Algumas das missões de resgate são altamente perigosas. Isso até aparecer Kérrera, uma menina-ovo, cujo corpo reduz de tamanho a cada ferida. Seu aparecimento vai levantar uma série de questões acerca da missão da nave espacial.
A narrativa é em primeira pessoa, feita por Ribu, a última exemplar da raça humana. A Terra desapareceu há algum tempo atrás, fazendo com que ela embarcasse no Borunga assim como todas as outras. Apesar de um início meio confuso, depois de algum tempo conseguimos nos acostumar com a dinâmica interna. Os personagens são muito variados, demonstrando a capacidade do autor de ser original ao criar novas espécies alienígenas. E o legal é que o Santiago não se prendeu a alguns axiomas típicos da raça humana: gênero, desenvolvimento, tempo de vida. Raro vai ser você ver raças humanóides dentro do Borunga; tem, mas não é comum. Gostei demais dessa abordagem do autor e isso vai se conectar com o que ele pretende entregar na narrativa. Não se preocupem por que a história é bem fácil de ser compreendida e o autor vai se focar mais na relação entre os personagens. Claro que estamos diante de uma personagem ainda não totalmente madura. Ribu parece alguém tentando se adequar à sua nova realidade. Por essa razão não podemos dizer que ela é uma narradora necessariamente confiável. Até porque são os sentimentos dela que nos são passados.
Um dos pontos legais da narrativa é em o quanto o autor se foca em mostrar as diferenças entre as várias espécies que habitam o Borunga. E a dificuldade que Ribu tem de entender determinadas especificidades de cada uma. O relacionamento dela com alguns personagens é conflituosa porque ela mantém determinadas premissas típicas dos seres humanos. Para ela, por exemplo, é difícil entender uma espécie que não tenha gênero, ou que possua mais de 4 gêneros. De que maneira se referir? Como conversar? Nossa linha de raciocínio não é preparada para isso. É difícil até imaginar isso. Alguns conflitos internos surgem por simples mal entendidos, como a forma estranha com a qual Kérrera se relaciona com seu planeta. É uma aula sobre diversidade. Melhor dizendo, é levar o próprio conceito de diversidade aos seus extremos.
Ao mesmo tempo a chegada de Kérrera levanta questionamentos acerca da missão do Borunga. E as informações não são tão claras mesmo para a tripulação. Ribu não consegue explicar a Kérrera o que eles fazem e por que eles fazem porque nem mesmo ela sabe disso. Aos poucos as coisas vão começando a ficar mais claras à medida em que Kérrera fica obcecada em obter respostas chegando até a colocar uma missão em risco. A tripulação é formada por muitas pessoas que não se questionam necessariamente preferindo entender o espaço como uma segunda chance. Mas, Kérrera se foca em saber os motivos por que seu resgate não ocorreu da melhor forma. Um bom questionamento é o fato de as pessoas serem retiradas de seus planetas, às vezes, sem terem liberdade de escolha. Já existe uma pessoa escolhida. Mas, qual é o critério? Por que resgatar só uma pessoa? Como as missões são escolhidas?
Curti bastante a história, mas senti um pouco de dificuldade de me relacionar com a narrativa e os personagens no começo. Achei que as informações são passadas de uma maneira um pouco truncada. Aos poucos vamos nos assentando com a tripulação e em vários momentos eu consegui associar a escrita do Santiago Santos com a de Becky Chambers em A Longa Viagem a um Pequeno Planeta Hostil. Onde o foco da narrativa está nas relações interpessoais e em suas diferenças. De toda a forma, é um excelente conto que trata de questões bem particulares. E vale também pela maneira como ele aborda os personagens e suas diferenças físicas e sociais.
Ficha Técnica:
Nome: Hei, Hou, Borunga Chegou
Autor: Santiago Santos
Editora: Revista Mafagafo
Número de Páginas: não informado
Ano de Publicação: 2020
Avaliação:
Comments