Em uma vila no interior da Inglaterra, Grace e Tilly tentam resolver o mistério do desaparecimento da Sra. Creasy. Mas, os habitantes da vila tem muitos segredos escondidos. E o que será que se esconde na casa 11?
Sinopse:
"Inglaterra, verão de 1976. A sra. Creasy está desaparecida e a Vila borbulha com fofocas. Os vizinhos culpam a sufocante onda de calor por seu repentino sumiço, mas as pequenas Grace e Tilly não estão convencidas disso.
Com o sol brilhando incansável no céu, as meninas decidem tomar o assunto em suas próprias mãos e, batendo de porta em porta atrás de pistas, percebem que todos na Vila têm algo a esconder. Enquanto a rua começa a revelar seus segredos, as pequenas detetives vão perceber que nem tudo é o que parece."
Quem mora em cidades pequenas sabe o quão prazeroso é habitar tais lugares: clima fresco, tranquilidade, uma certa liberdade. Mas, ao mesmo tempo, o ambiente de uma cidade pequena pode ser opressivo. Todos controlam a vida de todos. E esse pequeno núcleo fica desconfiado quando existe um elemento estranho coexistindo com eles. É esse cenário idílico, porém opressivo que a autora conseguiu representar de maneira incrível em seu romance.
Gostei demais da escrita da autora. O que ela faz na narrativa é incrível porque ela alterna entre uma escrita em primeira pessoa e outra em terceira pessoa. Não é algo simples de ser feito e exige técnica e experiência. Os capítulos narrados em primeira pessoa são do ponto de vista da Grace apresentando suas aventuras ao lado de sua companheira Tilly. Nesses capítulos a autora precisa mostrar o mundo através dos olhos de uma jovem menina de dez anos. Toda a ingenuidade e a leveza de uma menina que está se encontrando com o mundo, se maravilhando e se desiludindo. Já os capítulos em terceira pessoa são apresentados de diferentes pontos de vista dos moradores da cidade. A dificuldade aqui é apresentar o mundo nos olhos destas pessoas. Mesmo que não esteja em primeira pessoa, a narrativa é uma em terceira pessoa muito próxima, ou seja, nós continuamos a enxergar apenas o que a pessoa está vendo e pensando.
Também existe uma alternância entre capítulos no presente e no passado. Nesse ponto a escrita se encontra com a narrativa pela necessidade de completar o quebra-cabeças que é essa história. A cada novo flashback novas informações, mesmo que sutis, são apresentadas ao leitor. A escrita da autora é muito gostosa e na metade da história eu já devorava oitenta ou cem páginas de uma só vez só de curiosidade de saber o que viria a seguir. Alguns capítulos são bem curtinhos tornando a leitura veloz. Outros capítulos são maiores fazendo com que o leitor penetre a fundo na mente dos personagens e reflita sobre as decisões que eles tomaram para si.
"(...) só é preciso que duas pessoas acreditem na mesma coisa para que tenham a sensação de pertencimento."
Para aqueles autores que desejam aprender a como desenvolver bem seus personagens, fica a dica desse livro. Joanna Cannon dá uma aula de como construir personagens com vozes diferentes. Tirando Grace e Tilly que são as duas gracinhas dessa história, todos os personagens são humanos demais. Todos tem seus contornos bem delineados: qualidades, defeitos, trejeitos, tiques. A autora desenvolve subtramas para todos tocando em elementos como xenofobia, preconceito, bullying, alcoolismo, casamento, adultério, velhice. O que mais me surpreendeu foi o crescendo desses personagens ao longo da história. No começo, a narrativa se foca mais na duplinha Grace e Tilly, mas depois os outros personagens acabam pedindo passagem e tomam conta da história.
Aqui novamente vemos como os três elementos da resenha que eu apresento (escrita, personagens e narrativa) se fundem em uma coisa só. Não dá para dissociar uma coisa da outra nesse livro. A construção de personagens é intrinsecamente ligada à escrita e à narrativa. Por exemplo, Brian é um personagem que sofre ao viver com uma mãe que o cerca de todos os lados. Acabou por formar um personagem que é inseguro o tempo todo na história. Ou Sheila que é o estereótipo da mulher fútil. A quantidade de tramas que são apresentadas ao longo da história é fascinantes e todas se ligam ao plot principal.
Minha única crítica é a falta de desfecho para alguns personagens. Senti que a autora poderia ter finalizado algumas narrativas de uma maneira melhor. Ou o surgimento de novos personagens na metade final da história que só serviram para a construção de algumas situações. O que aconteceu a esses personagens? Algumas subtramas como a doença da Dot (apesar da revelação no finalzinho) ficam para trás. Eu entendo o que a autora quis fazer ao deixar muita coisa em aberto, mas me deixou um pouco frustrado.
Ah, tem uma situação no finalzinho que eu acho que ficou ruim quando foi traduzido. O "Ela está chegando" se refere ao pronome it em inglês. It pode ser tanto ele como ela, mas é normalmente usado para coisas. Fica essa observação para quem já terminou de ler o livro e vai entender porque eu fiz essa observação a respeito de uma frase que vem poucas linhas a seguir. E a frase não se refere ao ônibus e nem a quem está chegando. É uma metáfora.
Bem, quanto a narrativa, ela é muito gostosa. Raramente eu consigo me divertir e me emocionar tanto ao mesmo tempo. A história começa de um jeito tão doce e gentil com as duas meninas e depois ganha ares de complexidade e tensão que acabam trazendo o leitor para dentro daquele mundo. Algumas frases da Grace e da Tilly são tão bonitinhas. O que eu vou falar não é spoiler porque acontece nas vinte primeira páginas... Elas procurando Deus é muito bonitinho. E a forma como a autora consegue construir frases tão profundas com a inocência das duas meninas é de uma doçura ímpar. Também é legal como são criados alguns plots bem interessantes para as duas meninas, lidando com a amizade das duas e a relação que ambas tem com suas respectivas famílias.
Sobre o lado mais adulto, a construção de mundo feita pela autora é de suma importância. Ela conseguiu reproduzir bem o ambiente de cidade pequena na história. Em alguns momentos da narrativa, a impressão é que eu estava em um ambiente claustrofóbico e que todos na rua e em suas casas estavam me observando. Me lembro de ter conversado rapidamente com a representante da editora e ela havia me dito que a comparação com A Garota no Trem era exagerada por causa das meninas. Olha, digo o contrário. Parece sim com um thriller principalmente quando as coisas começam a serem reveladas. O leitor fica se perguntando: quem fez isso? quem fez aquilo? Digno de uma boa história desse gênero. E novamente... o final não me agradou. Aberto demais... inconclusivo demais. Fiquei um pouco chateado, mas não tirou nem um pouco o brilho da narrativa criada pela autora.
Entre Cabras e Ovelhas é um romance incrível que vai te colocar frente a frente com o que há de pior nas cidades pequenas: o ser cidade pequena. Grace e Tilly conquistaram o meu coração como as minhas protagonistas preferidas. E esse livro tem uma cara de série de TV; aquela carinha simpática, aquele rostinho posudo de série. Queria demais ver esse livro ganhando outras mídias porque essa é uma história que fala a todos nós. Que fala de amadurecimento, de casamento, de preconceito e de tantas outras coisas. Você vai se divertir e se emocionar com os personagens dessa pequena cidade do interior da Inglaterra.
Ficha Técnica:
Nome: Entre Cabras e Ovelhas
Autora: Joanna Cannon
Editora: Morro Branco
Gênero: Romance/Suspense
Tradutora; Celina Portocarrero
Número de Páginas: 472
Ano de Publicação: 2017
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*Material enviado em parceria com a Editora Morro Branco
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