Uma linda história envolvendo Pamela, uma menina que foi adotado por um casal de alienígenas erianos e precisa conviver com uma série de questões como o suicídio de seu pai adotivo (algo inédito para os erianos) e seu sentimento de culpa por isso.
Sinopse:
Pam é uma humana adotada por um casal de erianos, uma espécie alienígena de octópodes telepáticos que veio para a Terra há mais de dois séculos. Aos trinta e dois anos e sem nenhum contato com os pais e os irmãos, se vê numa situação inusitada quando recebe dezenas de mensagens do pai através de uma rede social pouco usada. Não haveria problema nenhum se não fosse por um detalhe: ele se matou há oito anos.
Um belo conto sobre relacionamentos e como a culpa pode afastar as pessoas, causando rachaduras terríveis em uma família. Benjamin escreveu uma história repleta de camadas e emoções que vão fisgar o leitor desde o começo. Só fica um aviso logo de cara que há alguns gatilhos na história: suicídio, abuso sexual. Ou seja, evitem caso a temática seja sensível para você. A narrativa gira em torno de um suicídio e vamos conhecendo mais e mais detalhes sobre o ocorrido. De forma alguma é uma narrativa apelativa, mas ela lida com os problemas de maneira direta e honesta.
Somos colocados em um mundo onde os alienígenas erianos são comuns. Alienígenas pacíficos, que se comunicam compartilhando os seus pensamentos coletivamente. Ou seja, todos sabem de tudo a todo momento como um ser só. Pamela foi adotada por um casal de erianos ao lado de seus irmão Diego e sua irmã Bela. Só que um elemento particular faz essa família não ser exatamente normal sob os padrões desse mundo: o pai adotivo de Pam é um eriano bem peculiar que não gosta de manter o vínculo coletivo comum à sua espécie. Ele é um escritor em uma comunidade que compartilha pensamentos e não vê a menor necessidade de manter livros impressos ou escrever histórias. Mas, um desastre acontece com essa família: por causa de alguns eventos terríveis, a doença de seu pai o leva a cometer suicídio. Algo que nunca aconteceu a nenhum eriano. Pamela acabou colocando a culpa em si mesma e toda a estrutura de sua família é abalada. A ausência de um membro importante da família fez com que os ânimos aumentassem e tudo se esfacelasse. Anos depois Pamela vive sozinha e tenta tocar a sua vida apesar de seus traumas. Até o dia em que recebe mensagens em uma rede social de seu pai morto. Isso a faz reviver tudo ao mesmo tempo em que sai atrás do responsável pelas mensagens.
Nossa... são tanto temas existentes nesse conto que eu nem quero tocar em todos. Acho que a graça é o leitor sentir as emoções transbordando das linhas da história. A escrita do Benjamin é potente e toca no fundo dos nossos corações. A narrativa é contada em primeira pessoa, o que permite ao leitor entender ainda melhor os sentimentos da protagonista. Ao mesmo tempo podemos dizer que a narradora é não confiável porque ela decidiu colocar todos os problemas sobre os seus ombros. Sua visão do que aconteceu é distorcida por causa de seu sentimento de culpa. Alternam-se momentos de diálogo com os personagens e os seus monólogos internos. A narrativa é fácil de ser compreendida e os elementos de ficção científica são sutis e quase não são tão importantes para a narrativa como um todo.
A sociedade humana tem problemas para aceitar os erianos dentro do seu meio. Pensar em alienígenas repletos de tentáculos e que se comunicam dividindo os pensamentos não é algo agradável para uma sociedade preconceituosa. Diga-se de passagem, preconceito é bem trabalhado mesmo na narrativa. Tem alguns momentos bem tensos acontecendo na história como o bullying que a Pam sofre quando era pequena ou o acontecimento trágico que foi um dos gatilhos para o suicídio de seu pai. Tem um momento muito doloroso quando a Pam pequena vai comentar com o pai sobre uma situação que acontece em sua escola. Cena muito forte.
A protagonista sofre com a culpa por aquilo que aconteceu a seu pai. Ela se sente responsável pelo suicídio e o silêncio de sua mãe durante o ocorrido, sem palavras de encorajamento ou amor acabaram por se tornar feridas profundas nela. Tanto que afetou seu relacionamento com Hermes, uma eriniana que Pam namorava há dez anos. Toda a vida adulta de Pam foi marcada por esse acontecimento e suas escolhas também se basearam nisso. Vemos o tempo todo a personagem lutando contra si mesma e não conseguindo se perdoar. Ao não conseguir seguir em frente a personagem fica presa em um looping de auto-depreciação. Investigar quem mandou as mensagens não só é uma forma de tentar resolver um mistério, mas uma jornada por um passado conturbado e uma necessidade de resolver pontas soltas a fim de curar feridas. Lógico que ninguém nunca mais vai ser a mesma pessoa, mas é importante encontrar um desfecho para tudo.
Emitindo é uma noveleta sensacional, para mim candidata a uma das melhores do ano. Uma narrativa que consegue prender o leitor e que possui tanta informação e tanta coisa acontecendo que parece um romance longo. Narrativa simples de ser compreendida, uma ficção científica leve e sutil que trabalha temas difíceis. E mesmo assim consegue passar muita coisa e nos fazer refletir sobre culpa e remorso.
Ficha Técnica:
Nome: Emitindo
Autor: Benjamin Edgar Jacob
Editora: Revista Mafagafo
Número de Páginas: não informado
Ano de Publicação: 2020
Avaliação:
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