Um ambicioso projeto visa criar uma civilização a partir de nanorobôs. O criador se torna uma espécie de deus para estas criaturas. Mas, até onde vai o poder de deus e a evolução de suas criaturas?
Estamos vivendo um momento único na história. Com tantos avanços científicos e tecnológicos, inúmeras possibilidades se apresentam para o homem. Dentre elas, a possibilidade de criar novas formas de vida. Se a possibilidade parecer remota, não se engane: ela é mais real do que parece. Cada vez mais trabalhamos com computadores com altíssima capacidade de processamento de dados. Alguns deles possuem até a compreensão de nossos comportamentos e procuram se antecipar a nós de forma a nos fornecer mais comodidade. Além disso, o homem passou a miniaturizar a capacidade de estocar informações. Pequenos cartões de memória substituíram os grandes hard drives. Toneladas de gigabytes de informação que cabem no nosso dedo indicador. Greg Egan partiu destes avanços científicos para mostrar um empresário tentando ficar à frente de seus rivais. Ele queria criar uma forma de vida artificial e evoluí-la até um estágio em que pudesse se tornar complementar ou superior ao homem. O autor não aponta especifiamente quais as motivações do protagonista. Ele é contraditório ao apresentar seus objetivos. No início do conto, o protagonista chama uma consultora para fornecer o aporte científico necessário ao projeto. Este é tão sigiloso que só poderia contar com um cientista como integrante. É o medo de ter seus projetos vazados à concorrência. Após apresentar o seu projeto, o protagonista não contava com a negativa da cientista. É então que ele se vê obrigado a confiar em Lucien, outro especialista em miniaturização e física para tocar o projeto. Lucien era como um plano B; a primeira consultora era uma especialista em comportamento robótico, algo que seria mais adequado ao projeto. Se analisarmos mais profundamente, Crystal Nights é uma história sobre ética. Ao tentar se fazer passar por um Deus, o protagonista busca o controle absoluto sobre o pequeno mundo que ele criou. Cada aspecto do ambiente, cada obstáculo apresentado e cada sucesso obtido é conquistado e realizado pelas mãos de Lucien, o encarregado do projeto. Logicamente que o protagonista é a mente impulsionadora do projeto. Em alguns momentos ele chega até a discordar de Lucien porque ele enxerga a evolução de sua vida artificial desta ou daquela maneira. Veremos que essas discordâncias e o rumo que o protagonista toma é que vão determinar o final do conto. O protagonista age como um deus ex machina de seu próprio mundo. Ele procura manipular determinadas condições para que seus nanitas possam evoluir do jeito que ele deseja. Mas, sua primeira consultora já havia lhe afirmado que é impossível forçar o processo evolutivo. A evolução acontece por causa da presença de desvios e variáveis não previstas. Apenas através de uma metodologia de tentativa e erro não é possível controlar a evolução. Em vários momentos em que o protagonista decide alterar alguma coisa, os nanitas responderam de outra forma não prevista. Quando ele quis desenvolvimento intelectual, por exemplo, os nanitas quiseram aumentar a população. Quando o protagonista se apresenta como o Criador, logo aparecem aqueles que duvidam (e, eventualmente, a traição). Quando ele quer que os nanitas desenvolvam a tecnologia de ir para o espaço, eles desenvolvem tecnologia quântica. Em um processo evolutivo, são muitas variáveis a serem pensadas. Se ainda somos seres imperfeitos, como esperamos ser capazes de criar nossa própria forma de vida? Gostei do conto e pude facilmente conhecer a escrita de Greg Egan. Muitos resenhistas consideram os seus livros difíceis de serem lidos e com temas extremamente complexos. Greg Egan é frequentemente classificado como hard sci-fi, ou ficção científica dura, no sentido de ser mais “científica” do que outros livros do gênero. Provavelmente eu tive sorte de conhecer este conto primeiro antes de me debruçar sobre algum romance do autor. O tema é muito bom e instiga a discussão. Pode até parecer clichê discutir sobre o homem se fazendo passar por Deus, mas nem sempre importa o tema por si só, mas a maneira como o autor trabalha o tema. E Crystal Nights é bem diferente e instigante. Entretanto, a história é bem direta e não apresenta personagens bem desenvolvidos. O conto serve para o autor apresentar como ele enxerga o homem se portando como um criador. Ou seja, se trata aqui de uma trata conduzida pelo tema (theme-driven story). Se formos pensar bem a fundo, se trata quase de uma história panfletária onde o autor se debruça sobre ética. O final é interessante e a reação do protagonista é típica de um homem de sua posição. E o autor brinca bastante com esse final.
Ficha Técnica:
Nome: Crystal Nights
Autor: Greg Egan
Conto que faz parte da coletânea The Mammoth Book of New SF 22
Editora: Robinson
Gênero: Ficção Científica
Ano de Publicação: 2009
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