Em uma narrativa que se estende pelo espaço de um ano, a cidade e os habitantes de Tarker's Mill será vítima dos ataques de um lobisomem feroz. Mas, a salvação poderá estar nas mãos de um herói improvável.
Sinopse:
"O primeiro grito veio de um trabalhador da ferrovia isolado pela neve, enquanto as presas do monstro dilaceravam sua garganta. No mês seguinte, um grito de êxtase e agonia vem de uma mulher atacada no próprio quarto. Agora, a cada vez que a lua cheia brilha sobre a cidade de Tarker’s Mill, surgem novas cenas de terror inimaginável. Quem será o próximo? Quando a lua cresce no céu, um terror paralisante toma os moradores da cidade. Uivos quase humanos ecoam no vento. E por todo lado as pegadas de um monstro cuja fome nunca é saciada. Um clássico de Stephen King, com as ilustrações originais de Bernie Wrightson."
Uma das coisas que mais me agradam como leitor é quando um escritor decide fazer algo fora do padrão. Testar algum tipo de escrita diferente, apresentar um twist na maneira de apresentar uma narrativa ou até vincular a outro veículo ou suporte de informação. Junte a isso o fato de eu ser um fã do Stephen King e temos um casamento perfeito.
É preciso destacar logo de cara o ótimo casamento entre imagem e escrita. Em um projeto bem diferente, A Hora do Lobisomem possui diversas imagens que servem para ilustrar algumas sequências. A inspiração para isso claramente está nos livros infantis que usam bastante desse recurso para estimular a imaginação das crianças. Aqui as imagens servem para fornecer toda uma outra dimensão à história. A escrita também é bastante peculiar. A narrativa se passa em um espaço de um ano em que cada capítulo representa um esquete ou uma cena específica no ciclo lunar. Fica aqui a minha crítica à editora que deveria ter mantido a tradução do título original, O Ciclo do Lobisomem, já que o título do livro reflete a maneira como ele foi composto. Não temos aqui um protagonista específico, perpassando vários deles ao longo do texto. Se podemos dizer que existe um protagonista esse pode ser o próprio lobisomem que está presente de uma forma ou de outra ao longo dos vários capítulos.
A narrativa acontece em terceira pessoa e King emprega muito o sentido da visão com ricas descrições aliadas a alguma imagem impactante. Os primeiros capítulos do livro possuem pouquíssimos diálogos e algumas cenas como a alucinação do pastor são marcantes. Como os capítulos são pequenos a leitura flui muito tranquilamente e, para quem já se acostumou à forma do King de escrever, tudo acontece de maneira muito orgânica. Aos poucos vamos formando a imagem da cidade em nossas mentes e os habitantes vão deixando de serem meras menções para se tornarem vivos.
Falar que o King desenvolve bem personagens é um pleonasmo. Porém, não senti aqui a presença daquelas figuras icônicas e até exageradas tão típicas do autor. Por esse motivo até fiquei um pouco decepcionado. Talvez por conta do espaço reduzido ou pelo próprio estilo da história mais focado no antagonista do que no desenvolvimento de outros personagens. Alguns personagens se destacam como Milt, o homem que agride sua mulher por puro prazer em vê-la sofrer diariamente. Ou a família de Marty que trata o filho com condescendência por ele ser um mero aleijado. O pastor Lowe que acredita estar fazendo uma missão divina mesmo que esta tome rumos improváveis. Ou o policial idiota que em um primeiro momento acredita que tudo não passa de superstição besta, mas que depois quer fugir de qualquer maneira mesmo que isso significa abandonar a cidade à própria sorte. E isso porque estamos falando de uma história que deve ter no máximo umas 70 páginas se tirarmos as imagens. Claro que a escrita do autor sofre um pouco com sua inexperiência já que este é um livro dos momentos iniciais de sua carreira. Apesar de ele já ter escrito sucessos inquestionáveis como Carrie, Salem e O Iluminado, aqui ainda temos o autor praticando sua escrita em outras formas.
Um dos temas trabalhados é a força da natureza. O tempo todo podemos perceber o quanto King quer deixar o leitor tenso com o poder que a natureza tem sobre nossas vidas. Ao mesmo tempo em que ela pode nos apresentar um tempo bonito e agradável, marcado pelo verde das florestas, ela pode nos enviar um animal selvagem capaz de destruir pessoas com suas garras e presas. Ninguém está seguro. Notar também que a história se passa sempre no ciclo lunar (apesar do próprio autor admitir inconsistência de datas), mas essa ideia reflete bem aquilo que ele desejava mostrar. Somos apenas um entre inúmeros seres que estão nas garras da Mãe Natureza. Fica aqui o destaque para mais uma cidade isolada que King emprega na história, mostrando o quanto ele se sente à vontade ao deixar os personagens presos dentro de um quartinho escuro. A sensação de claustrofobia vai seguir a escrita do autor.
A fé e a superstição são outros dois pontos tocados por ele na narrativa. O tempo todo os habitantes duvidam da existência de um lobisomem na cidade. Mesmo quando todos os indícios apontam para alguma coisa diferente. Os acontecimentos vão ficando cada vez mais intensos e sobrenaturais e mesmo assim ninguém compra a ideia de ser uma criatura assim. Já o homem de fé acredita estar fazendo um trabalho divino. Busca na Bíblia uma justificativa honesta para os atos selvagens que comete. O dono do posto de gasolina também busca uma justificativa religiosa para "passar a mão" no que os seus clientes gastam em seu estabelecimento. Outros habitantes da vila frequentam a igreja local e cometem crimes espúrios. O que King mostra é como o ser humano é hipócrita e busca justificativas tolas para ações injustificáveis. O terror de King está muitas vezes no coração negro do homem.
A Hora do Lobisomem é um livro gostoso e que passa rápido. A gente fica com aquele gostinho de quero mais, e somos presenteados também com belíssimas ilustrações que se sucedem uma após a outra. Fica o destaque para a edição da Suma que como extra propôs a alguns desenhistas destacarem alguma cena marcante da história. São quatro quadros que se encontram após o final da história e são lindos.
Ficha Técnica:
Nome: A Hora do Lobisomem
Autor: Stephen King
Editora: Suma
Gênero: Terror
Tradutora: Regiane Winarski
Número de Páginas: 152
Ano de Publicação: 2017
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