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Foto do escritorPaulo Vinicius

Resenha: "Fluam Minhas Lágrimas, Disse o Policial" de Philip K. Dick

Imagine-se sendo um apresentador de um programa de auditório famoso em toda a parte. Seu rosto é visto por milhões de pessoas; adorado por uns, odiados por outros. Um dia você segue a um motel em um encontro às escondidos e no dia seguinte ninguém se lembra quem você é. Esta é a trama proposta por Dick. Saibam mais na nossa resenha. 

Sinopse:


No romance "Fluam, minhas lágrimas, disse o policial", Philip K. Dick explora os limites entre percepção e realidade, criando uma impressionante distopia na qual Jason Taverner, um dos apresentadores mais populares da TV, um dia acorda sozinho num quarto de hotel e percebe que tudo mudou; que se tornara um ilustre desconhecido. E pior. Descobre que não há qualquer registro legal de sua existência. Dividido agora entre duas realidades, ele vê-se obrigado a recorrer ao submundo da ilegalidade enquanto tenta reaver seu passado e entender o que de fato aconteceu, dando início a uma estranha busca pela própria identidade. Ao unir à trama desconcertante uma sensível incursão no comportamento e nas emoções humanas, Philip K. Dick prende o leitor e faz desse livro um de seus trabalhos mais comoventes. Escrito em 1974, "Fluam, minhas lágrimas, disse o policial" [Flow My Tears, the Policeman Said] foi publicado pela primeira vez no Brasil nos anos 1980, sob o título Identidade Perdida: O Homem que Virou Ninguém. O livro foi indicado aos prêmios Nebula, em 1974, e Hugo, em 1975, ano em que venceu do prêmio John W. Campbell como melhor romance de ficção cientifica.




Resenhar qualquer livro escrito por Dick é sempre uma tarefa muito difícil. Ele tem a habilidade de dizer mais em poucas páginas do que muitas obras que vemos por aí. Não basta olharmos diretamente para a história por que o autor gosta de brincar com o que é real ou não.

O protagonista de Fluam Minhas Lágrimas é o apresentador de um programa de auditório visto por milhões de espectadores. Um homem charmoso, elegante e com vários casos amorosos. Sua rotina semanal é regada a champanhe e uma ida à sua casa de veraneio, na Suíça. Mas um destes casos amorosos vai colocar Jason Taverner, nosso protagonista boêmio, em uma complexa trama. Após discutir com uma de suas amantes, Taverner acorda em um hotel barato somente com seu dinheiro e a roupa do corpo. Mas, uma coisa está errada: ninguém mais conhece Jason Taverner, o queridinho das telinhas.

“Você não deveria se assustar com tanta facilidade. Ou a vida será demais para você! ”

Este livro trabalha muito com o conceito de identidade. O que nos torna reais: o que sabemos sobre nós mesmos ou o que os outros sabem sobre nós? Jason Taverner sabe exatamente quem é, mas isto de nada adianta para ele. Sem que as pessoas saibam quem ele é, Jason não tem identidade. Dick quer dizer que um indivíduo é moldado por aquilo que a sociedade acha que ele é.

Outro tema recorrente é o da frivolidade da vida dos famosos. Encerrados em sua vida de excessos eles nada sabem sobre a realidade do ser humano comum. Jason se perde quando precisa lidar com pessoas reais com problemas reais. Claro que Dick coloca personagens extremamente paranoicos, mas uma das cenas mais indicativas disto é quando Jason interage com uma mulher que faz vasos decorativos. Ele logo quer arrastar a mulher para sua vida de excessos, mas tudo o que ela deseja é que suas obras tenham o devido reconhecimento. A falta de tato de Jason é evidente, marcada por um comportamento narcisista.

"Ao entrar no apartamento de Marilyn, ele viu de imediato que ela estava fora de controle. Todo o seu rosto estava tenso e contraído, o corpo tão encolhido que ela parecia estar tentando engolir a si mesma. E os olhos. Pouquíssimas coisas em uma mulher ou em torno dela o deixavam desconfortável, mas aquilo o deixou. Os olhos dela, completamente redondos, com pupilas imensas, voltados para ele, enquanto ela o encarava em silêncio, de braços cruzados, absolutamente inflexível, rígida como ferro."

​A ambientação da história é calcada em um ambiente opressor. Todas as pessoas são vigiadas de perto e aqueles que pertencem a um campus universitário são consideradas subversivas. Dick dá algumas pistas sobre o que levou a esta sociedade opressora como uma Segunda Guerra Civil Americana e as prisões arbitrárias de pessoas que não obedecem ao novo regime. Parece que existe uma espécie de Conselho Militar responsável pela administração da ordem e das punições. Duas forças policiais, os nacs e os pols são responsáveis diretos pelo regime. Os nacs são oriundos do antigo Conselho de Segurança Americano e trabalham acima da lei fazendo o trabalho sujo. Já os pols são os policiais comuns, além de reguladores daqueles que possuem passe livre.

Nesta sociedade opressora, o antagonista, um policial de carreira e membro do Conselho Militar, vê seu mundo ficar de cabeça para baixo quando ele precisa prender alguém que não existe em um sistema de rastreamento e identificação supostamente infalível. Sua irmã é viciada em drogas pesadas como mescalina e outras que afetam os sentidos. E ele se vê tendo que cobrir os erros cometidos por sua irmã para não prejudicar sua carreira. E a irmã deste policial é a única pessoa que parece conhecer Jason Taverner neste estranho mundo. Caminhos se cruzam em uma história fascinante e extremamente sensível. Dos livros que já li de Dick, este apresentou a habilidade do autor em nos fazer questionar a respeito de nós mesmos e nosso papel no mundo.

"Diante disso, ele desistiu. Não tem jeito, disse a si mesmo. Como se vivesse num mundo feito de borracha. Nada permanecia no lugar. Tudo mudava de forma com o toque ou até mesmo com o olhar."

Eu geralmente atribuo duas estrelas aos trabalhos de Dick pelo estilo cerebral da escrita, mas a falta de preocupação em ser coerente ao longo do livro. Por exemplo, nesta obra, ele não se preocupa em explicar como ou por que Taverner foi parar no hotel barato no começo da história. Dick prefere nos colocar em um labirinto fazendo com que nos percamos em suas nuances. Mas, este livro merece três estrelas pela maneira como ele constrói e conduz os personagens. Mesmo o antagonista é um personagem bem delineado e passível de nos afeiçoarmos a ele. A psicótica, a aproveitadora, o policial cansado, a irmã drogada, todos são personagens que nos fazem sentir algo por eles.


Ficha Técnica:

Nome: Fluam Minhas Lágrimas, Disse o Policial Autor: Philip K. Dick Editora: Aleph (no Brasil) Gênero: Ficção Científica Tradutora: Ludimila Hashimoto Número de Páginas: 256 ​Ano de Publicação: 2013

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