Uma menina desperta de seu sono embaixo de uma árvore em um mundo estranho e diferente. Enquanto ela descobre como veio parar ali, ela precisa ajudar os meninos da Aldeia das Mil Cores a solucionar alguns problemas.
Sinopse:
Quando adormeço, surge a imagem de um céu estrelado e de um caminho iluminado pelo luar. A noite parece estar fria. Os três cavaleiros seguem, lado a lado, a um passo rápido e em silêncio. Mas eu oiço-o! Oiço o seu pensamento, como se falasse apenas para mim. Olá Pequenina! Vi que recebeste o meu presente! Não te preocupes, amanhã de manhã elas estão de volta e ficarão para sempre junto a ti. Não pude esperar por vocês. A Aldeia da Planície teve um problema com as chuvas e é preciso ir ajudar a reconstruir as casas e o dique principal, que ficou desfeito. Espero que acompanhes a Aura até lá. Dorme bem Pequenina! Dorme com a certeza que me acompanharás esta noite. **************** Os meninos já dormem a sono solto, quando consigo finalmente adormecer. Ouve-se o som de água a correr, que se mistura com o burburinho agitado e confuso dos meninos. - Alguém tem de segurar o outro lado! - grita um menino de cabelos compridos. - Não! É muito perigoso! - grita Filipe. A estrutura do novo dique está espalhada no leito do rio. Os meninos, encharcados e cansados, olham desanimados para ela. Depois de dois dias de trabalho, a força da água destruiu a estrutura de madeira que estava a ser montada. - Não vale a pena! Não vale a pena! Não vamos conseguir! - grita Filipe, enquanto se afasta frustrado. - Partimos amanha de manha. - diz o guardião mais baixo - Ele tem de parar e de se afastar! - Filipe, o problema foi a força da água. Estávamos a fazer tudo de acordo com o plano. - Eu tenho de sair daqui. - diz Filipe. Desperto com a imagem de um olhar perdido e desesperado.
Para quem acredita que escrever literatura infantil é simples, essa resenha vai fazer você mudar de ideia. Antes de qualquer comentário sobre o livro, eu preciso aplaudir a iniciativa da Sonia Ribeiro. Esse é um mundo difícil de se conquistar porque existem tantas coisas a se pensar ao escrever para um público tão específico que qualquer autor quando vê as dificuldades desiste do projeto. E a Sonia entregou um trabalho competente, mesmo com suas falhas. E eu acho que a autora está no caminho certo para se destacar nesse meio.
A escrita é o elemento fundamental em um livro desse gênero. Não é possível não atentar a esse aspecto. A escolha de palavras precisa ser adequada, as situações colocadas precisam estar em sintonia com a idade pretendida. Há até mesmo uma necessidade de uma certa musicalidade no encadeamento de palavras. O vocabulário empregado não pode ser muito complexo de forma com que a criança precise entender tudo o que se passa no cenário. O ponto alto de No Cantinho do Arco-Íris é sem dúvida a escrita. Nesse ponto a autora foi muito feliz. Os capítulos são pequenos e rápidos e o livro tem o tamanho certo para esse público.
Entretanto, como eu comentei com a própria autora, esse é um livro que foi publicado de forma errada. Ele tinha que ser um livro ilustrado. A escrita da autora é muito colorida, muito vivaz. Toda vez que eu terminava um capítulo, eu repetia: "Poxa... como essa cena ficaria incrível com um desenho". E isso vai seguir ao longo de todo o livro. Imagine uma cena dos meninos na aldeia ajudando uns aos outros. Em uma aldeia em que os meninos moram em casas com as cores do arco-íris de acordo com suas tarefas e inclinações. Em formato de prosa corrida, o livro perde boa parte da sua magia. Sabe quando a história grita para ser mostrada? Estamos diante disso. E isso não é culpa da autora. Provavelmente a possibilidade de fazer um livro desse porte para um autor iniciante é muito custoso. Sei disso porque minha esposa trabalha analisando livros infantis e eles são caríssimos. Só de imaginar o trabalho com projeto gráfico deles me dá um nó na cabeça.
Mas, ao mesmo tempo, existe um ponto negativo que aí sim é algo que eu posso ajudar a autora. Acho que os personagens ficaram indistintos demais. Tirando a Aura e o Paulo que a autora se detém mais, os personagens parecem ter as mesmas vozes. Às vezes eu precisava ler duas vezes um mesmo trecho para saber de quem ela estava falando. Como se trata de um livro infantil, não é possível dar muita complexidade aos personagens, caso contrário a criança acaba perdendo o interesse. Mas, dá para colocar algumas características específicas, através de caricaturas de virtudes ou defeitos. Um personagem mais sapeca, outro que fala alguma expressão (tipo... um menino que sempre pergunta por que... ou outra menina que sempre diz "Puxa vida" quando está surpresa), ou uma menina travessa que apronta todas. Dá para equacionar as personalidades extremando características. Minha sugestão para a autora é buscar inspiração em outros consagrados como Ana Maria Machado, Ziraldo ou Maurício de Souza para ver quais as estratégias que eles usam na composição dos personagens. Por exemplo: é inegável o quão simples uma personagem como a Magali da Turma da Mônica é: uma menina comilona. Mas, ao mesmo tempo, Maurício de Souza deu uma tridimensionalidade única a ela.
O tema da amizade e da cooperação é muito bem trabalhado pela autora. Eu me imaginaria lendo o livro para o meu filho (se eu tivesse um né...). Porque a história ressalta a necessidade de trabalhar em equipe para alcançar um bem comum. Cada um apoia o outro e cada um tem suas características específicas. Somente com a união desses esforços é que é possível chegar à solução dos obstáculos apresentados. São mensagens extremamente importantes para a nossa sociedade nos dias de hoje.
A construção do mundo também começou como uma ideia muito interessante, mas ainda não foi devidamente aproveitada pela autora. Ela me confirmou que vão sair outros livros que se passam nesse mundo. O mundo do arco-íris funciona como um reflexo dos sentimentos do príncipe Filipe. Se ele está triste, aparece uma Floresta Sombria; se ele deseja aventuras no mar, aparece uma Aldeia do Mar. E os integrantes do mundo são como as cores do arco-íris representando as emoções dele. O curioso é que a própria geografia do lugar reage a esse estado de espírito. Quando a protagonista começa a ajudar os meninos, alguns caminhos difíceis se abrem entre as aldeias, a floresta sombria fica menos sombria. Ao mesmo tempo, a presença de um elemento estranho no mundo do príncipe causa algumas situações inesperadas como um alagamento.
Entretanto, o livro deixa muitas pontas soltas como a própria identidade da protagonista. Conversando com a autora, eu descobri quem ela é, mas essa informação não fica muito clara na história. Se eu, que sou mais adulto e tenho bagagem literária, não consegui descobri, para uma criança fica ainda mais complicado. E isso se repete para outras situações. Faltou aqui um leitor beta perceptivo para a autora para ajudá-la a perceber esses pequenos furos de narrativa. Também faltou mencionar que esse livro se trata de um primeiro volume em uma série. Mas, a editora em si está careca de cometer esses furos. Porém, a autora poderia ter colocado um indicador disso no final da história.
Este é um livro infantil de boa qualidade, necessitando de uma revisão por parte da autora. Só o fato de ela ter arriscado escrever uma história voltada para um público tão exigente e cheio de peculiaridades já é elogiável. A escrita também é muito competente e adequa-se tranquilamente à faixa etária proposta. Entretanto, existem alguns problemas na construção de personagens e na condução da narrativa que precisam ser revistos. De toda a forma, Sonia Ribeiro é uma autora que você deveria ficar de olho. Ela tem todo o potencial para nos surpreender com projetos maravilhosos. Ah... Quero o livro ilustrado de No Cantinho do Arco-Íris. Por favor!!!! Nós precisamos!!!!
Ficha Técnica:
Nome: No Cantinho do Arco-Íris
Autora: Sonia Ribeiro
Editora: Chiado
Gênero: Fantasia
Número de Páginas: 78
Ano de Publicação: 2017
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