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Foto do escritorPaulo Vinicius

Resenha: Clarkesworld nº134

Inaugurando nossa seção de resenhas da Clarkesworld, essa é a edição de novembro de 2017. Vários contos de autores de fantasia e ficção científica como Daryl Gregory e Suzanne Walker.



1 - "Prasetyo Plastics" de D.A. Xiaolin Spires


Título: Prasetyo Plastics Avaliação:

Autora: D.A. Xiaolin Spires

Gênero: Ficção Científica



Ali Prasetyo é alguém que sempre quis ter um olhar no futuro. Em um de seus momentos de luz inspiradora, ele buscou usar uma impressora 3-D para criar um tipo de plástico que pode ser usado em qualquer área. Só que ele não contava com a evolução do plástico ao se ligar a um outro tipo de ser vivo. Ele chega à conclusão de que podemos ter nosso lugar no mundo tomado pelos plásticos que ameaçam a nossa vida na Terra.

Gostei da premissa de Xiaolin Spires embora a execução tenha ficado um pouco aquém do que eu esperava. A ideia de trabalhar com conceitos ecológicos e até com impressoras 3-D e seu impacto no mundo não é novidade. Eu li Autonomous há pouco tempo e Annalee Newitz se baseia justamente nisso. O que eu senti nas linhas apresentadas é que a autora teve uma boa ideia, mas ela foi se perdendo com o decorrer da narrativa. Por exemplo, para que serve a relação entre Ali e Karina? Apenas para dar uma esposa ao personagem? Eu imaginei que a esposa poderia talvez servir como a voz da razão ou até confrontar as escolhas feitas pelo personagem, mas não é isso o que acontece. Achei que tudo ficou em uma proporção muito teórica, como se tudo estivesse sendo enxergado de cima. Trata-se de um bom conto científica que vai nos apresentar conceitos intrigantes, mas é só. Faltou um desenvolvimento melhor nos personagens.

A ideia do plástico como algo que possa tomar conta do nosso planeta é curiosa. Achei assustadora a ideia de que algo como o que é apresentado na história possa acontecer, e não é algo inteiramente impossível. Até porque o ser com o qual o plástico se liga é bem simples em sua constituição celular. Daí para uma possível evolução seria um salto de milhares ou milhões de anos. Claro que para os fins de composição da história, a autora apressou um pouco essa evolução. Legal, é algo a se refletir quanto à preservação dos mares e do nosso meio ambiente. Quando vemos a quantidade de lixo plástico despejado diariamente nos rios e oceanos podemos realmente estar nos encaminhando para mergulharmos em plástico mesmo. E quem disse que a próxima evolução das impressoras 3-D não tem a ver com o plástico propriamente dito?

A escrita da autora é um pouco confusa em alguns trechos, mas ela consegue entregar uma boa história. Para quem está preocupado com o emprego de expressões complexas ou jargões pode ir tranquilo. Achei o texto da Xiaolin mais fácil de entender do que o de Autonomous que emprega muitos termos de patente e de farmácia. Só realmente achei que eu não comprei os personagens, o que acabou fazendo com que a história não tivesse o impacto esperado.


2 - "Retrieval" de Suzanne Walker


Título: Retrieval Avaliação:

Autora: Suzanne Walker

Gênero: Ficção Científica



Imagine se, no futuro, durante as expedições espaciais, quando um indivíduo morresse, sua alma ficasse presa no espaço, ficando à mercê de seres obscuros e cruéis. Essa é a premissa de Suzanne Walker nesse conto. Os Recuperadores são pessoas encarregadas de recuperar a alma destas pessoas e trazê-las de volta para casa. A protagonista está atrás de seu pai que morreu em circunstâncias terríveis e junto de sua mentora Ferrier, elas estão no encalço da alma de seu pai. Mas, não será fácil trazê-lo de volta. Para nossa protagonista, esta missão é muito mais do que buscar a alma de uma pessoa. É buscar uma pessoa amada.

Suzanne Walker faz uma construção de personagens extremamente competente. A gente percebe todo o drama por trás da missão; tudo o que significa aquilo para a protagonista. Encontrar um ambiente hostil é algo que ela jamais esperaria de seu próprio pai. Ter escrito em primeira pessoa foi muito acertado e consegue nos passar todos os sentimentos da protagonista de uma forma bem direta e pessoal. Até mesmo o questionamento acerca do papel dos deuses nesse estranho cenário é visto. Será que os deuses estão cuidado das almas das pessoas mesmo que estas estejam tão longe?

A ideia dos caçadores de almas é muito interessante. Ainda não tinha visto nada parecido em outras histórias. Ou seja, o que vemos é uma mescla de elementos sobrenaturais com pura ficção científica. Eu gostaria de ver uma história mais longa nesse tipo de cenário. Enfim, a narrativa tem uma boa condução, deixa muita margem para outras histórias e se fecha a partir de um bom impacto. A autora tem um bom encadeamento de palavras e eu fiquei perdido apenas no comecinho, mas deu rapidamente para entender aonde ela queria chegar com a história. Os cenários são bem simples: o local onde a mãe da protagonista foi enterrada e o local onde se encontra a alma de seu pai. Me parece que eles levam o espírito do pai a uma espécie de templo, isso ficou um pouco confuso para mim.

Enfim, temos uma história pequena, mas com muita coisa a se contar. A autora nos introduziu a um mundo que pode conter outras histórias, então vamos aguardar para ver se alguma editora compra a ideia da autora. Com uma mescla bem inusitada de gêneros, Suzanne Walker entrega uma história competente e com vários ganchos deixados para os leitores.



3 - "Dead Heroes" de Mike Buckley


Título: Dead Heroes Avaliação:

Autor: Mike Buckley

Gênero: Ficção Científica



A chegada de uma estranha condição chamada O Vazio faz com que as pessoa se esqueçam de todas as coisas. Isso acaba deixando os seres humanos vulneráveis ao ataque de forças alienígenas. Após O Vazio, um estranho ser chamado A Floresta Viva começa a tomar conta de todas as regiões do mundo se alimentando dos homens e os absorvendo para si. O Vazio vem todas as noites se alimentar também das memórias das pessoas. O protagonista acredita ainda na figura de Catalus, um grande herói do passado que foi capaz de proteger muitas pessoas. Mas, a condição de seu pai e de Tim que se tornam cada vez mais ausentes, faz com que ele comece a perder as esperanças de um mundo melhor. E se torne vítima da Floresta Viva.

Olha, eu acredito que este conto tenha sido concebido como um romance e depois o autor tenha reduzido-o para caber neste formato. Isto é muito transparente porque vemos toda uma profusão de ideias aparecendo aqui e ali que necessitariam de muito mais páginas para ser desenvolvido. Como não foi, isto acaba provocando muita confusão no leitor. Percebi no final o que o autor quis dizer com a narrativa após separar as duas ideias do Vazio e da Floresta Viva, sendo que ambas deveriam ser entendidas juntas. Essa confusão acabou tornando a escrita truncada demais. E a escrita acaba não ficando legal ao mesmo tempo já que o autor se perdeu durante a narrativa. O encadeamento de palavras não é bom, então estamos o tempo todo precisando voltar alguns parágrafos para que as ideias possam ser absorvidas.

A ideia de trabalhar questões acerca da memória não é nova e eu até li um conto muito bom neste sentido. O protagonista se ressente um pouco de que seu amigo e seu pai estejam tão avançados na condição de pessoas sem memória e acaba passando um pouco deste seu sentimento para as linhas. Mas, ao mesmo tempo ficou parecendo uma muleta isso; Tim e o pai poderiam ter sido deixados um pouco de lado e o protagonista poderia ter sido colocado em outras situações que reforçassem aquilo que está assolando o planeta. Tim acaba funcionando como aquele que propulsiona a história para a frente ao colocar o protagonista em situações arriscadas. Entretanto, nada em Tim me faz querer que o protagonista deseje salvá-lo. Muito pelo contrário: eu queria que o autor desse um fim logo no personagem.

Pelo título já dá para perceber que o tema da narrativa é a importância dos heróis para as pessoas comuns. Isso o autor consegue trabalhar bem na narrativa. A gente percebe que os personagens parecem sem rumo e sem motivação para traçar algum plano para o futuro. Todos se deixaram abater pela condição do Vazio. Muitos deles já desistiram e perceberam que não há esperanças mais. Quando o protagonista se refere a Catalus ele demonstra sua fé inabalável de que existe a possibilidade de um futuro melhor. Enquanto ele foi capaz de manter essa esperança, sua força esteve presente a todo momento, seja incentivando Tim e seu pai, seja resolvendo algum obstáculo que se interpôs entre eles.

Dead Heroes é um conto bem fraco e eu não recomendo. Acho que o autor precisava de bem mais espaço para desenvolver suas ideias e este conto não foi capaz de atingir os objetivos que ele havia traçado para si.


4 - "Who Won the Battle of Arsia Mons" de Sue Burke


Título: Who Won the Battle of Arsia Mons Avaliação:

Autora: Sue Burke

Gênero: Ficção Científica



Adoro ser surpreendido. Sério! Tem histórias que eu pego sem nenhuma expectativa, já com a minha caneta vermelha na mão, aguardando o que eu posso criticar. Até este quarto conto, eu tinha me decepcionado bastante com o conteúdo desta edição da revista e o início deste conto não fez muito para ajudar. Mas, quando o conto chega quase na metade, sou lindamente surpreendido. Sue Burke foi extremamente inteligente em esconder o jogo por boa parte da história e deixar muito do que ela queria nas entrelinhas. Este é um dos melhores contos nesta edição não pelo que a história lhe apresenta diretamente, mas tudo o que pode ser retirado no rastro da história central.

A história é contada em uma espécie de relatório feito após os acontecimentos da narrativa. É quase como se fosse um interrogatório onde os personagens prestam contas dos acontecimentos e fazem alguns comentários em cima. Aliás, relatório não é nem bem a palavra; eu senti como se estivesse em um documentário feito por um telejornal. A escrita da autora é bem direta e não se foca em nenhum personagem em particular. Existe até alguns termos um pouco mais complicados, mas é possível se acostumar daqui a algumas páginas. Trata-se de uma aposta feita entre cientistas na Terra sobre quem seria capaz de construir o melhor robô para uma espécie de battle royale acontecida em um terreno escolhido no planeta Marte. Quatro concorrentes deveriam construir seus robôs e quando todos estivessem completos, eles seriam enviados a Marte aonde a competição seria mostrada em todos os veículos de informação.

Quando eu entendi do que se tratava a história no começo, achei a ideia boba. Não achava possível uma autora escrever uma história tão boba quanto uma disputa besta de superioridade robótica no espaço. E da maneira como tudo estava sendo construído, não parecia ser legal. Só que Sue Burke tentou construir tudo da maneira mais verossímil possível dentro de sua extrapolação. Ela dificultou a construção dos robôs, colocou uma série de obstáculos e fez com que cada um dos concorrentes construísse a sua versão da coisa. Uma das empresas chegou a fazer um financiamento coletivo para tentar levar o projeto adiante. E aos poucos vamos vendo os bastidores da construção destes robôs. A empresa que fez o financiamento coletivo acabou tendo uma série de problemas com CEOs que não conseguiam levar adiante o projeto. Outro grupo precisou lidar com todas as críticas acerca de sua arquitetura considerada infantil e boba. Os chineses construíram um robô que parecia muito com um soldado de Terracota. E eles desejavam o estrelato acima de tudo. E uma última empresa sofreu um ataque terroristas porque um grupo de investidores reclamava do uso de dinheiro das pessoas para uma iniciativa tão sem pé nem cabeça.

Só isso que eu descrevi aí em cima já dá uma noção das sutilezas presentes na história. Mas, tem mais... e se no lugar onde eles fossem lutar, a humanidade descobrisse sem querer, pela primeira vez na história da exploração espacial, vida inteligente em Marte? Daí eles decidiriam parar e estudar as criaturas, certo? Mas, e se um dos robôs tivesse perdido o controle por causa de algum acontecimento na Terra. É tanto desastre que acontece ao longo deste conto que a gente fica pensando se alguma coisa vai dar certo em uma última análise. E é isso que é o mais legal na narrativa: tudo é muito possível. São tantas variáveis envolvidas em um tipo de empreendimento desses que, acontecer algum acidente é mais provável do que o sucesso na missão.

As cenas de luta que acontecem no finalzinho são incríveis. Regadas a momentos emocionantes, fazia tempo que eu não lia uma boa batalha entre robôs. Adorei a maneira como a autora conseguiu manter o leitor preso por mais de vinte páginas em uma sequência de cenas de ação. Extremamente eficiente mesmo. A narrativa consegue amarrar todas as pontas e nos entregar um final muito digno, apesar de eu ter ficado desconfiado acerca de algumas coisas que ocorreram na metade da narrativa. Algumas coisas não ficaram bem explicadas, mas percebi que isso foi proposital da parte da autora para nos deixar com a pulga atrás da orelha.

Conto recomendadíssimo, se vocês puderem, leiam no site da Clarkesworld (acho que é possível ler via url). A autora parece que vai publicar algo no início de 2018, logo eu vou ficar ligado e certamente interessado no que ela colocar à venda.



5 - "The Catalog of Virgins" de Nicoletta Vallorani


Título: The Catalog of Virgins Avaliação:

Autora: Nicoletta Vallorani

Gênero: Fantasia




Histórias sobre clones são bastante comuns entre os autores de ficção científica. Algumas delas se tornaram memoráveis como Battlestar Gallactica. Desde que a ficção científica adotou um propósito mais social e psicológico que vemos histórias desse gênero abordando temáticas mais éticas. Nicoletta Vallorani apresenta uma narrativa bem impactante tocando em temas pertinentes, mas é muito prejudicada pelo espaço do conto.

Um mundo distópico onde clones são usados em rituais de estupro coletivo e acabam morrendo pela insanidade do ato em si. Sim, meus caros, esse é o mote principal da trama. Temos uma narrativa em primeira pessoa onde o protagonista se vê diante da terrível história de cinco clones que tiveram suas vidas brutalmente reduzidas por esses atos bárbaros. Alguns dos momentos são narrados por aquelas que passaram pelos próprios atos, que descrevem de forma bem direta o que elas sentiram e como suas vidas se esvaíram. Dá um tom de impacto absoluto à narrativa.

Eu só achei que a autora não teve o espaço necessário para desenvolver o que ela gostaria de dizer. As informações são passadas ao leitor de uma maneira atrapalhada e confusa, o que acaba prejudicando a compreensão completa da história. E o tamanho reduzido da narrativa onde ela precisa passar por vários pontos de vista de uma só vez acaba fazendo com que a gente não sinta qualquer empatia pelo protagonista. Só desenvolvemos algum sentimento por conta dos relatos impactantes do que é feito aos clones. A escrita é tão crua que é impossível a gente não sentir nada.

Acho um tema extremamente pertinente que acabou sendo mal desenvolvido devido aos limites impostos pela própria autora na composição de sua narrativa. Esse conto merecia umas 100, 120 páginas para que a autora pudesse ter a liberdade absoluta de nos encantar e revoltar com sua narrativa. Infelizmente não recomendo esse conto por tudo o que não está presente nele e tudo o mais que eu gostaria de ver.


6 - "Second Person, Present Tense" de Daryl Gregory


Título: Second Person, Present Tense Avaliação:

Autor: Daryl Gregory

Gênero: Fantasia?



E se houvesse uma droga capaz de quebrar a conexão entre o cérebro e a capacidade do ser humano de tomar decisões? Não uma droga que amplifique desempenhos ou que produza melhorias, mas uma que provoque o esquecimento, a perda de noção acerca do que é a realidade. A tal ponto que isso formaria uma segunda pessoa dentro de si mesmo com suas próprias reações e personalidade. Essa é a proposta de Second Person, Present Tense onde Therese está tendo aconselhamento psicológico para tentar recuperar a velha Therese seja através de técnicas terapêuticas até métodos não convencionais.

Gostei demais do ritmo da história. Admito que no início achei o conto estranho e não estava entendendo qual era a proposta e nem aonde o autor queria chegar. Aos poucos vamos sendo imersos na mente estranha de Terry e o autor vai nos mostrando os meandros da coisa. Não conseguia entender se se tratava de uma possessão, de um clone, de uma outra personalidade. Mas, mais ou menos na metade do conto vamos nos dando conta de que se trata da mesma pessoa sob efeito de uma droga supostamente alucinógena e silenciadora. E o conto sai da simples ficção científica (ou fantasia) para se tornar um thriller. É assustador o que a Terry passa. Ela não consegue entender como pode existir uma outra pessoa dentro dela mesma. E isso vai corroendo a personagem por dentro. Ela não entende o que é real ou não. E é incapaz de trazer a pessoa que os pais de Terry querem de volta. Não importa o que eles façam para tornar isso uma realidade.

Ao mesmo tempo vemos o drama dos pais desesperados por terem sua garotinha de volta. O que fazer em uma situação como essa? Deixar as coisas como estão, na esperança de que as memórias retornem? Buscar métodos alternativos na esperança do aparecimento de algum que seja capaz de reverter o poder da droga? Submeter sua filha a remédios que talvez alterem para sempre o cérebro da pessoa? Isso é um drama terrível e os pais ao longo da trama vão passando por vários estágios psicológicos junto da filha: a ira de perceber que Terry não colabora porque ela não sabe como colaborar; a tristeza de saber que o que se quebrou jamais pode ser recuperado; o arrependimento de não ter sido capaz de impedir que algo assim acontecesse; ou a aceitação de que pelo menos sua filha está viva de alguma maneira.

O tema principal desse conto é a identidade. O que nos torna nós? O que compõe a nossa personalidade: a experiência do que vivemos ao longo dos anos ou o tempo presente? É uma questão complexa que vem sendo estudada por sociólogos e especialista em psicologia há anos. Se pensarmos em a nossa identidade sendo baseada em nossas experiências, podemos cair em uma armadilha como essa do conto. Foi o que Daryl Gregory procurou nos mostrar. Apesar de toda a extrapolação em cima do tema, eu achei algo bem interessante e até revi algum dos meus posicionamentos sobre o que compõe a nossa identidade. Sem dúvida alguma, o nó que se formou na cabeça de Terry é parte da incompreensão que ela tem de que sua identidade não é verdadeira e que poderia existir outra pessoa que não ela mesma dentro de sua mente. Ela não compreende porque ela vive o agora... e o agora diz a ela que as suas experiências atuais são as reais. Mesmo quando todos dizem que isso é mentira.

Um conto absolutamente complexo e que vai fazer você refletir de alguma maneira. Ficção especulativa de boa qualidade é assim! É desafiar o leitor, é tornar sua leitura uma experiência da qual algo será retirado. Essa é a essência desse gênero e é algo que vem da década de 1970 quando homens como Philip K. Dick nos provocava fazendo com que questionássemos o que era real ou não. Só isso já me fez desejar ler outras coisas do autor.


7 - "Martian Blood" de Allen M. Steele


Título: Martian Blood Avaliação:

Autor: Allan Steele

Gênero: Ficção Científica



As histórias de John Carter se tornaram muito famosas nos EUA. As explorações nos rios de Marte, os combates contra jeddaks, contra tiranos e até líderes de seitas levavam os americanos à loucura nas décadas de 1920 e 1930. Até os dias de hoje vemos reflexos da obra de Edgar Rice Burroughs nos livros de muitos autores de ficção científica. Allan Steele pegou toda essa herança e influência e ressignificou em uma história onde a colonização de Marte se tornou algo maligno. Nosso protagonista é uma espécie de faz-tudo que é contratado por um doutor para levá-lo até uma comunidade de marcianos. Nesse mundo, os seres humanos acabaram construindo grandes cidades e os marcianos se afastaram da esfera de influência dos homens e se retiraram para uma vida no interior dos desertos marcianos. São muito avessos ao contato com os homens e apenas poucos deles como Ramsey são capazes de se aproximar e entender os mesmos. Mas, o doutor deseja uma gota de sangue dos marcianos. Ele quer provar que terráqueos e marcianos possuem uma origem comum. Mas, isso vai ser uma jornada extremamente complexa e difícil.

O leitor é colocado em uma espécie de Las Vegas em Marte. Tudo respira John Carter: as garçonetes estão vestidas como as mulheres de Carter, os seguranças vestidos como marcianos vermelhos, e até tem estátuas simulando as montarias das histórias de Burroughs. Isso mostra a banalidade dos objetivos do homem ao colonizar outros planetas. Vemos que tudo o que tem na Terra foi transplantado para o planeta vermelho. Tanto as coisas boas como as coisas ruins. Essa crítica social é forte à medida em que hoje pensamos em singrar o espaço seja para encontrar outros seres inteligentes ou para criar um mundo melhor. Mas, o autor deixa claro que o ser humano visa apenas repetir o que ele fez aqui na Terra.

A relação entre terráqueos e marcianos se assemelha demais a de colonizadores e colonizados. Os colonizadores espanhóis expulsaram os nativos para o interior do continente. Estes ou foram escravizados ou criaram uma forte aversão aos europeus. Com o tempo essa aversão acabou se transformando em guerras que duraram muitos séculos. Os povos indígenas acabaram massacrados pela superioridade tecnológica dos europeus. Aqui, não é que o autor coloca que os marcianos serão exterminados, mas que isso pode acontecer. Um determinado acontecimento no conto dispara um gatilho que faz o protagonista pensar se vale a pena deter um certo conhecimento ou não. Vale a pena arriscar o tênue equilíbrio da relação entre humanos e marcianos?

Gostei muito do conto de Allan Steele e eu creio que este não é o primeiro conto que leio dele. Mas, de toda forma, gostei do ritmo e da maneira como tudo é construído progressivamente. Mesmo em uma realidade absurda de colonização em Marte com elementos estranhos e curiosos, a narrativa manteve sua seriedade acima de tudo. Recomendadíssimo e para quem ficou curioso, este conto é parte da coletânea Old Mars que a editora Arqueiro lançou com o título As Crônicas de Marte no início de 2018.


Ficha Técnica:

Nome: Clarkeworld número 134 Publicada em novembro de 2017 Editores: Neil Clarke Número de Páginas: 170


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