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Foto do escritorPaulo Vinicius

Resenha: "A Oração dos Miseráveis" (Legado do Ferro Negro vol. 1) de Gareth Hanrahan

A cidade de Guerdon esconde segredos terríveis. Após um roubo que não sai como deveria, Cari, Ratazana e Mastro se envolvem em uma conspiração que coloca diversas facções da cidade uma contra a outra.


Sinopse:


Na cidade de Guerdon, três ladrões foram injustamente acusados de um crime. A busca deles por vingança vai revelar não apenas verdades sombrias sobre o lugar onde vivem, mas também uma perigosa conspiração, cujas sementes foram plantadas muito antes de eles nascerem. Um poder malévolo está se agitando nas profundezas dos túneis da cidade, e uma guerra mágica de séculos está prestes a acontecer novamente. Cari, uma órfã sem-teto que luta contra as sombras de seu passado, Ratazana, um carniçal que vagueia pelo submundo, e Mastro, portador de uma terrível doença que está petrificando sua carne, foram unidos pelo acaso ― e a amizade deles pode ser a única coisa que impede a destruição total.






Cidades podem ter lendas e segredos terríveis. São como enormes organismos artificiais que agregam vida e destinos em seu seio. Gareth Hanrahan nos entrega uma história sobre história e memória e como elas podem ser alteradas ou apagadas de acordo com a vontade dos poderosos. Ele fala também de uma amizade surgida da tragédia; laços que unem pessoas de uma maneira tão forte e poderosa que mesmo que o destino os coloquem em caminhos opostos, eles sempre voltarão um para o outro. A Oração dos Miseráveis é uma fantasia sombria que busca inovar em alguns trechos embora em outros possa manter o que sempre vimos. Se não é revolucionário, entretém e muito o leitor introduzindo conceitos sobre divindade e inimigos que são bastante criativos.


Cari, Mastro e Ratazana são enviados pelo chefe da guilda dos ladrões para realizarem um assalto ousado na Torre da Vigia, um dos edifícios centrais da cidade. Entendendo que existe um plano nas maquinações de Heinreil, eles seguem confiantes até que tudo dá muito errado. Uma terrível explosão acontece no cofre próximo onde um segundo grupo de ladrões (que eles não sabiam que estavam lá) estava em ação. Cari e Mastro são capturados por Jere, um mercenário a mando de um dos figurões da cidade. Ratazana consegue escapar só para se ver tragado para uma estranha missão guiando Aleena, uma santa que manuseia uma poderosa espada de fogo, para visitar os anciões carniçais. Depois desse início explosivo, veremos que Cari passou a ter estranhas visões e pode estar envolvida em algo maior do que ela mesma. Mastro vai precisar buscar no fundo do coração a coragem que veio de seu pai, o revolucionário Idge. A cidade de Guerdon nunca será mais a mesma depois que a poeira baixar.


O livro começa com um prólogo bem divertido que serve para nos mostrar as habilidades de escrita de Hanrahan. Ele nos conta toda a cena do assalto à Torre de Vigia de um ponto de vista bem curioso: o da própria Torre (ou seria o do sino... fiquei em dúvida depois porque os sinos tem um papel importante na história). Já ali ele surpreende um pouco o leitor alterando sua expectativa. Só achei que ele poderia ter usado esse recurso mais vezes, talvez dividindo a narrativa em várias partes e usando os momentos iniciais para nos fazer entrar, literalmente, na cidade. A tradução está ótima e olhe que esse livro usa uns jargões traiçoeiros que fogem do padrão. Por exemplo, não temos orcs ou ogros ou gigantes... temos Homens de Sebo (parece um nome bobo, mas já já o leitor vai se dar conta de o quanto eles são oponentes formidáveis). Cabeça de Gaivota, o Arroio (onde vive parte da população mais empobrecida), a existência das santas. Porém, achei a escrita do Hanrahan meio apressada. Em certos momentos, o leitor tem a impressão de que ele pulou frases. Como se faltasse algo que conectasse duas orações. Senti isso ao longo do livro todo. Não prejudica a leitura de forma alguma, mas passa uma sensação estranha.

Apesar dos três ladrões serem os protagonistas, ele divide o foco da narrativa entre outros personagens como Jere, Eladora, Kelkin. Até certo ponto na história, senti que Ratazana havia sido deixado de lado porque ele tem poucos momentos da narrativa em que a luz da ribalta está em cima dele. E a própria jornada que ele tem é bastante superficial. Mas, isso muda lá pela metade da história, e pude compreender que o autor parece querer deixar para explorar mais do personagem em outros volumes. Mantendo um aspecto misterioso ao seu redor contribui para essa imagem. Outro ponto que vale destacar sobre os personagens é que o autor não tem medo de matá-los a qualquer momento. A situação que eles vivem na cidade é crítica com forças que tem poderes quase divinos atuando nas ruas. Algum personagem morrer em combate, ser pego em uma explosão ou ser atingido por algo saído do nado é bastante comum. Entenda que os personagens estão ali por uma razão e esta só será revelada no momento adequado.


A cidade de Guerdon ganha vida nas mãos do autor. Aos pouquinhos ficamos familiarizados com os diversos locais que a compõem, seja o Arroio, as diversas igrejas espalhadas pela cidade, o Mercado Marinho onde o comércio é realizado, o bairro dos Alquimistas onde tudo é seguro e luxuoso, a Academia. Tudo isso é regido por um equilíbrio tênue onde Kelkin facilitou a entrada de cultos religiosos vindos de outras regiões do continente. Isso para dificultar a dominação dos Guardiões, um grupo de fanáticos religiosos que empregam Deuses Guardados para fortalecer suas habilidades. Por outro lado, existe o legado deixado pelos deuses do Ferro Negro que abalaram as estruturas da cidade no passado e foram derrotados pelos Guardiões. No meio de tudo isso temos uma irmandade de ladrões sendo tocada por um líder de guilda que começa a ser questionado por seus subordinados. As alianças que ele tem feito tem incomodado principalmente porque a origem da Irmandade está na figura de Idge, um homem que se colocou contra os poderosos em defesa dos mais vulneráveis. Sua liderança o tornou uma figura lendária. Resta saber o quanto Heinreil é capaz de se segurar em sua autoridade vinda do poder e do medo.


Fazendo a conexão direta com Mastro, filho de Idge e a quem todos pensavam que seguiria os passos do pai e liderar a Irmandade. Mas, ele foi vítima da doença de pedra, uma condição que vai calcificando os ossos da pessoa e o transformando em pedra lentamente. É uma doença cruel e que não tem cura, com o ponto final sendo a paralisia total dos homens de pedra. Estes são levados para uma ilha onde são deixados como estátuas vivas. A única maneira de atrasar a evolução da doença é tomando uma injeção de uma substância chamada de alkahest. Esta solução dá um alívio temporário e os homens de pedra acabam se tornando dependentes dela para sobreviver. A doença é também altamente contagiosa, bastante um contato entre pedra e pele nua para a condição passar. Por esse motivo, homens de pedra são vistos com muito preconceito pela sociedade. Mastro é capturado logo no início junto com Cari por Jere e são colocados sob interrogatório para poderem dizer quem é o real mandante do assalto. Jere sabe que foi Heinreil, mas ele precisa de uma confissão completa para poder levá-lo à justiça. Só que Mastro é fiel até o último fio de cabelo à Irmandade, uma instituição que foi criada por seu pai e cujo sacrifício foi o que deu força a ela. Mastro é mantido prisioneiro e o tempo vai passando e não há muito espaço para ele continuar evitando a calcificação de seus ossos.

Por outro lado, Cari é uma garota que vive se mudando de cidade para cidade. Ela chegou em Guerdon e foi recolhida por Heinreil que a juntou a Mastro e Ratazana. Os três compartilhavam de uma vida muito complicada e formaram laços de amizade. Cari é a descendente da família Thay, que no passado foi acusada de serem invocadores dos deuses do ferro negro. Todos os membros do tronco principal da família, incluindo Jerma, o pai de Cari, foram mortos pelos guardiões. Desde então o nome Thay é amaldiçoado por toda a Guerdon. Cari retorna à cidade depois de muito tempo e se vê às voltas com estranhas visões desde que aconteceu a explosão na Torre. Ela consegue visualizar pessoas a distância além de saber o que ela esconde em seus corações. Ela acaba se envolvendo com o professor Ongent, um professor da Academia que parece ter um real interesse em suas novas habilidades. E é na Academia, que Cari vai reencontrar sua prima Eladora, que agora possui o sobrenome Duttin. Cari e Eladora parecem não se dar bem já que ambas tiveram crescimentos muito contrastantes uma da outra.


Em fuga dos Homens de Sebo, Ratazana é contratado por Aleena para levá-la aos setores inferiores da cidade onde vivem os carniçais mais antigos e poderosos. É lá que Ratazana vai entender que forças poderosas parecem estar despertando pela cidade. E os alquimistas parece que tem parte da responsabilidade sobre os eventos estranhos e explosivos que tem acontecido nos últimos tempos. Aleena é uma mulher que não tem nada de santa, apenas muito poder e uma espada sagrada capaz de cortar quase todo o tipo de criatura. Seu temperamento é bastante instável, algo que Ratazana vai presenciar de perto. No meio de toda essa confusão, Ratazana vai se questionar qual é o seu papel em toda essa trama. Carniçais são seres imortais e não costumam dar muita atenção ao mundo dos vivos. Seus sentimentos são efêmeros porque eles, de certa forma, já estão mortos (ou sua existência já é a morte em si). Só que ele não sabe o que fazer em relação a Cari e a Mastro a quem ele parece ter desenvolvido algum tipo de laço.


Entre tantas histórias que se interconectam, A Oração dos Miseráveis fala de laços indeléveis capazes de unir várias pessoas. Como estes laços são tão fortes que um grupo de pessoas pode se tornar um porto seguro um para o outro. Em vários momentos, esses laços serão testados e a cada um deles é oferecida a opção de ir embora e viver tranquilamente em outro lugar. Só que a decisão que cada um faz em prol do outro vai surpreender os leitores. Além de uma revolução que vai acontecer pela cidade e revelar fatos e histórias que estavam há muito tempo escondidas. Só o tempo dirá o que estas revelações irão causar.














Ficha Técnica:


Nome: A Oração dos Miseráveis

Autor: Gareth Hanrahan

Série: Legado do Ferro Negro vol. 1

Editora: Trama

Tradutor: Fábio Fernandes

Número de Páginas: 512

Ano de Publicação: 2021


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